O que é o Programa de Proteção Legal para Jornalistas?
O Programa de Proteção Legal para Jornalistas é uma iniciativa da Abraji para garantir assistência jurídica a jornalistas e comunicadores que, em razão de seu trabalho, estejam sendo silenciados ou constrangidos por meio de processos judiciais. Profissionais que estejam sendo assediados, ameaçados e perseguidos e que tenham interesse em processar civilmente os agressores também podem ser acolhidos pelo programa.
A iniciativa foi lançada em abril de 2021, em resposta ao crescimento das ameaças à liberdade de imprensa e do assédio judicial a jornalistas e comunicadores no Brasil. No programa, recebem prioridade os profissionais que trabalham fora dos grandes centros urbanos e que não possuem apoio financeiro dos veículos para os quais trabalham.
Os critérios para ser atendido pelo programa constam neste documento. Os jornalistas que se enquadram nos requisitos podem enviar o seu caso por meio deste formulário ou para o canal oficial de atendimento: o email [email protected].
Profissionais de imprensa que necessitarem apenas de orientação jurídica em casos de assédio e ameaça no ambiente on-line continuarão sendo atendidos pelo convênio estabelecido entre a Abraji e o Observatório de Liberdade de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Com a criação do programa, o acordo entre as duas entidades foi integrado à iniciativa. A orientação ocorre após o caso ser enviado e analisado pela Abraji.
O Programa de Proteção Legal para Jornalistas é realizado com financiamento da organização internacional Media Defence e parceria com o Instituto Tornavoz, e tem como objetivo prestar assistência jurídica a até seis profissionais no prazo de 18 meses.
Casos acolhidos pelo programa
Em julho de 2021, a Abraji tornou público o primeiro caso do Programa, o do jornalista Alexandre Aprá, fundador do blog Isso é Notícia. Aprá é alvo de diversos processos movidos por pessoas ligadas ao grupo político do governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM). A defesa financiada pela Abraji é sobre um processo civil movido pelo então secretário da Casa Civil de Mato Grosso, Mauro Carvalho Junior. O autor alega ter sofrido ofensa à honra com a publicação de reportagens sobre a compra de jatos de luxo realizada pelo governo estadual, que foi objeto de pedido de providências do Conselho Nacional de Justiça. Como indenização, Carvalho Junior solicita 14 salários mínimos (R$ 15,4 mil).
O segundo caso atendido pelo Programa foi divulgado em setembro do mesmo ano. A fundadora do blog Combate Racismo Ambiental, Tânia Pacheco, está sendo processada devido a duas matérias da Comissão Pastoral da Terra do Nordeste republicadas em seu site. Os conteúdos relatam conflitos entre antigos posseiros e latifundiários no município de Maraial, localizado na Zona da Mata de Pernambuco. O autor da ação é o empresário Walmer Almeida Cavalcante, filho de Walmer Almeida Silva, latifundiário citado nas reportagens. No processo, Cavalcante pede a retirada das publicações, a retratação dos réus em suas redes sociais e a condenação ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil.
Em abril de 2022, a Abraji anunciou que o programa incluiu outros dois profissionais processados pelo exercício da profissão: a jornalista Josette Goulart e o repórter fotográfico Marcelo Chello Carneiro da Silva. Eles são alvos de uma ação judicial movida pelo empresário Luciano Hang, dono das Lojas Havan, contra uma charge, publicada no canal Lagartixa Diária, às vésperas do depoimento de Hang à CPI da Pandemia, em setembro de 2021. A defesa de Hang alega que o conteúdo da charge teria sentido calunioso e pede indenização no valor de R$ 100 mil a título de danos morais, além da remoção do conteúdo das redes sociais.
Ainda em 2022, a Abraji acolheu o caso da agência de jornalismo independente Amazônia Real, processada pelos empresários Waldery Areosa Ferreira e Daniel Henrique Louzada Areosa e pela empresa WL Sistema Amazonense de Turismo. A ação foi motivada pela publicação de uma reportagem que investigava uma série de festas clandestinas promovidas durante a pandemia em embarcações que navegavam pelo rio Negro, no Amazonas. Além do pedido de retirada de conteúdo, os autores do processo solicitam indenização por danos morais no valor de R$ 8 mil.
Em março de 2023, foi acolhido o caso da comunicadora Lana Holanda, mais um alvo de Luciano Hang. Ela responde na Justiça de Santa Catarina a uma ação de indenização por danos morais, movida pelo empresário em razão de um comentário que fez no Twitter. Hang pediu uma indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil, além da exclusão do conteúdo sob pena de multa diária de R$ 10 mil.
A Abraji anunciou, dois meses depois, o suporte à defesa do jornalista Paulo Cezar Prado, do Blog do Paulinho. O apoio do programa abrange o caso em que Prado é processado criminalmente pelo desembargador Miguel Marques, conselheiro do Corinthians e magistrado designado junto ao Juizado Especial do Torcedor. São duas ações: uma interpelação criminal, que pede explicações sobre a publicação de duas reportagens; e uma queixa-crime, que pede a responsabilização pela suposta prática de crimes de calúnia, injúria e desinformação pela publicação das mesmas matérias.
Também em 2023, a Abraji acolheu o caso do jornalista Vinícius Macía, da cidade de Mococa (SP), processado pela vereadora e ex-prefeita interina do município, Elisangela Mazini Maziero Breganoli. No processo, ela solicita que reportagens sobre uso de dinheiro público sejam retiradas do ar e pede publicação de desculpas por parte de Macía, além de indenização no valor de R$ 8 mil.
A jornalista Sara York passou a ser acompanhada pelo projeto em outubro do mesmo ano, que garantiu sua defesa no processo em que busca responsabilizar a prefeitura de São Pedro da Aldeia (RJ) por agressões sofridas no Carnaval deste ano. Ela foi agredida fisicamente por um dos secretários da prefeitura e por seguranças quando tentava fotografar, do palco, o evento municipal.
O jornalista Mikhail Barros e Favalessa também foi acolhido, em razão de uma condenação que sofreu da Justiça de Mato Grosso após publicar uma reportagem no site O Livre sobre a atuação da juíza Olinda de Quadro Altomare Castrillon, da 11ª Vara Cível de Cuiabá. A magistrada moveu uma ação contra o jornalista e o editor-chefe do veículo na época, Guilherme Adzgauskas Waltenberg, que assinavam o texto. Em primeira e segunda instâncias, os jornalistas foram condenados ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$30 mil.
Em 2024, outros dois casos foram acolhidos pelo programa. O jornalista Rafael Duarte e a agência de notícias Saiba Mais recebem apoio da Abraji e defesa jurídica, feita pelo escritório Flora, Matheus & Mangabeira Sociedade de Advogados, em um processo movido contra uma matéria que relata a denúncia de uma família sobre o sumiço de uma criança e do seu genitor fora do período acordado para a divisão da guarda. O genitor não quis conversar com a reportagem e ingressou com uma ação judicial pedindo a condenação em danos morais no valor de R$ 100 mil. São alvos da ação o veículo que publicou a matéria, o jornalista como pessoa física e a advogada da mãe da criança, que é citada na matéria.
O segundo caso é dos jornalistas Alexandre Aprá, Pablo Rodrigo e Ulisses Lalio, em razão de processos cíveis e criminais movidos pelo governador do estado do Mato Grosso, Mauro Mendes (UB), ou por pessoas ligadas a ele. Em todos os casos, os jornalistas são atacados no exercício da profissão, reportando sobre fatos de interesse público que envolvem o grupo político que comanda o estado.
Confira a cartilha lançada pela Abraji e pelo Observatório de Liberdade de Imprensa da OAB, em 2020, a “Cartilha sobre medidas legais para a proteção de jornalistas contra ameaças e assédio online", documento que orienta jornalistas sobre como proceder diante de ataques virtuais e assédios.