- 12.04
- 2022
- 14:00
- Abraji
Acesso à Informação
Relatório avalia acesso à informação pública na América Latina
Atualizado às 16h15 do dia 16.ago.2022.
A rede Voces del Sur (VdS), da qual a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) faz parte, lançou seu primeiro relatório que avalia a regulamentação e implementação de políticas públicas de acesso à informação em 13 países da América Latina. O informe reconhece que a região dispõe de mecanismos legais que garantem o direito de acesso a informações, mas alerta sobre os problemas que dificultam a aplicação efetiva dessas leis.
O estudo foi criado para acompanhar a implantação de um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados pela Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são metas estabelecidas pela ONU em 2015 para erradicar a pobreza, garantir a paz e a prosperidade até 2030. O levantamento foi feito a partir de uma metodologia comum desenvolvida com o aval da UNESCO para examinar especificamente o indicador “ODS 16.10.02”, que trata das garantias constitucionais ou estatutárias para o acesso público à informação.
O relatório “Acceso a la información pública: informe sombra en la implementación del Objetivo 16.10.02 del Desarrollo Sostenible en Latinoamérica” teve como foco a área da saúde, resultado direto do impacto da pandemia de covid-19 na sociedade e na gestão pública. A versão em português foi disponibilizada pela Abraji em ago.2022 e pode ser acessada aqui.
Em abril, a VdS promoveu um debate para marcar o lançamento do relatório, com a participação de Anabella Rivera, diretora executiva do Instituto Demos Guatemala; César Ricaurte, diretor executivo da Fundamedios no Equador; Marianela Balbi, diretora executiva do IPYS na Venezuela; e Indira Salazar, oficial de Programas da UNESCO em Quito. A gravação do evento está disponível no canal da Fundamedios no YouTube.
No evento, também foram lançados dois documentos específicos com base no monitoramento: um sobre a situação de acesso à informação no Equador; e o outro relativo à Venezuela.
A pesquisa analisou quatro pontos: acessibilidade por meio de pedidos de informação; regulação e estrutura institucional para o acesso à informação pública; qualidade da transparência ativa na área da saúde; e transparência ativa na gestão da pandemia. Foram 13 os países monitorados (Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Cuba, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Peru, Uruguai e Venezuela).
O informe ressalta que o trabalho da sociedade civil na região apresenta “avanços notáveis”, como a promoção de leis de acesso e a contribuição à agenda internacional pautada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
No entanto, apesar de 11 dos 13 países avaliados terem dispositivos legais para que qualquer cidadão possa solicitar dados, documentos e contratos ao Poder Executivo, há pontos críticos que impactam no sucesso desses pedidos. A produção de dados estruturados não necessariamente garante transparência ou se traduz numa implementação efetiva. O documento lembra que, “mesmo em países com sistemas de acesso mais maduros, observam-se desafios que se somam às práticas que levam à opacidade por parte de servidores públicos”.
A metodologia do estudo não incluiu a análise do Judiciário e do Legislativo, e faz uma ressalva ampla sobre a percepção do direito de acesso à informação entre os cidadãos. Concluiu-se que a utilização desse direito está concentrada entre determinados grupos, como organizações da sociedade civil e jornalistas, o que revela desconhecimento grande da população. Para a rede VdS, os governos tampouco priorizam ações para promover e disseminar essas garantias.
No que se refere às ferramentas que viabilizam o acesso a informações, o monitoramento revelou problemas gerais de acessibilidade. A disponibilização de dados em formatos inadequados para deficientes visuais foi citada como um obstáculo.
Outro tópico salientado foi a resistência por parte dos governos em fornecer informações políticas sensíveis, como em casos de uso de recursos públicos. Esse tipo de dado, quando investigado, pode indicar desvio de verbas do contribuinte e até revelar grandes casos de corrupção na administração pública.
Quanto à transparência ativa de informações sobre a pandemia, isto é, quando o setor público disponibiliza informações sem que haja uma solicitação, persistem os problemas de transparência na gestão da crise sanitária:
“Dois anos após a crise, os mecanismos ativos de transparência deveriam ter melhorado. Isto é particularmente relevante considerando a importância destas informações para os cidadãos em situações de vida ou morte”, destaca o texto.
O relatório sublinha a dificuldade na obtenção de respostas em todos os países e no cumprimento das obrigações de publicar informações de forma proativa. E enfatiza o crescimento de pedidos negados pelo Poder Executivo com base em justificativas questionáveis, “como razões de segurança, dados pessoais sensíveis nacionais ou falta de informação”.
O Brasil, assim como Venezuela, Peru e Bolívia, aparece de forma positiva como um dos quatro países latino-americanos que publicam, de forma completa e orgânica, os contatos de órgãos responsáveis pela Saúde. Ainda segundo o documento, o Brasil melhorou na apresentação de dados oficiais de combate à pandemia.
Cuba e Nicarágua são criticadas como nações nas quais não se podem realizar pedidos de informação por questões de segurança e pelo temor de assédio por parte das autoridades. O Brasil também é citado, em escala menor, como exemplo de assédio estatal contra quem solicita dados. De forma geral, diz o documento, “a crise gerada pela covid-19 tem sido usada pelos governos para não cumprir suas obrigações de transparência passiva e ativa”.
Atuação em rede
É a primeira vez que a Voces del Sur faz uma avaliação voltada exclusivamente para a transparência pública e medidas regionais que podem levar à obstrução do direito de acesso a informações. O relatório conta com apoio do Programa Internacional para o Desenvolvimento da Comunicação da UNESCO.
A rede reúne atualmente organizações da sociedade civil de 15 países da América Latina e do Caribe. Desde 2019, a Abraji é responsável por registrar os casos no Brasil que representam ataques contra jornalistas, violações à liberdade de imprensa e à liberdade de expressão e do direito de acesso à informação. Os alertas são então sistematizados pela VdS e constam no Relatório Sombra, divulgado anualmente.