- 29.11
- 2018
- 16:38
- Aimee Rinehart
Liberdade de expressão
O que a API do WhatsApp significou para o Comprova
Nosso projeto colaborativo de verificação, o Comprova, juntou 24 redações no Brasil para desmentir desinformação em torno das eleições presidenciais que ocorreram em outubro de 2018. O First Draft queria facilitar um projeto no Brasil porque ele é a maior democracia no hemisfério sul e está se tornando um país cada vez mais polarizado. Nós também queríamos olhar mais de perto como a desinformação se espalha no fechado aplicativo de mensagens WhatsApp. O Brasil tem uma adoção massiva do WhatsApp, com cerca de 120 milhões de pessoas na plataforma.
API soa pomposo, mas o que realmente isso significa para o Comprova? Pela primeira vez, o WhatsApp deu para uma iniciativa de jornalismo sem fins lucrativos a capacidade de receber perguntas do público por meio de um site intermediário, o Zendesk. Se tivéssemos utilizado o WhatsApp Business, nós teríamos um celular para tentar responder às quase 70 mil questões que o projeto recebeu. O Zendesk foi integrado à nossa conta business e permitiu que vários jornalistas e estudantes de jornalismo revisassem “tickets”, ou perguntas do público. Durante a maior parte do projeto, quatro jornalistas monitoraram questões. Durante o último mês da eleição, havia 10 pessoas designadas para classificar e peneirar os “tickets”. Através desse processo, a equipe começou a ver padrões de desinformação e os enviou para os editores para que eles considerassem ao investigar. O time também respondeu à pessoa que enviou a mensagem original com uma nota simples ou um link para um artigo publicado sobre o tópico.
Nos dias que antecederam o primeiro turno, em 7.out.2018, a integridade da votação era uma preocupação entre as pessoas, que faziam perguntas para o número de WhatsApp do Comprova. Fotos de boletins de urna declarando vencedores circularam desde cedo on-line. Com base no interesse do público e notando uma possível tendência de votos baseados em desinformação, os parceiros do Comprova colaboraram na verificação da autenticidade da foto e publicaram reportagens esclarecendo sobre as imagens dos boletins. As fotos eram autênticas, mas o “vencedor” descrito no boletim era apenas da seção eleitoral, e não o resultado final da eleição. A equipe respondeu as perguntas sobre esse boletim de urna com um link para o desmentido do Comprova. No Zendesk, nós criamos uma “macro” (respostas pré-formatadas em uma lista de opções). Assim, com um único clique, nós podíamos enviar o desmentido para cada pessoa que perguntou sobre os boletins de urna; a resposta foi enviada 900 vezes para diferentes pessoas que perguntaram sobre isso.
O projeto colaborativo CrossCheck da França durou 10 semanas na primavera de 2017 e recebeu 600 questões do público através de um formulário no site. Nós fomos avisados pelos jornalistas brasileiros que poderíamos esperar receber 600 questões dos brasileiros na primeira hora. Eles disseram isso sem rir e estavam certos sobre o engajamento da população: o Comprova recebeu quase 70 mil questões do público. Durante a primeira semana de outubro, até o primeiro turno, a conta no WhatsApp recebeu uma média de três mil questões por dia. O gerente de projetos do Zendesk reportou que a plataforma costuma receber duas mil mensagens por mês para os seus clientes mais ativos, então o Comprova foi uma experiência particularmente “viral”.
Nós tivemos uma curva de aprendizado para aprender os recursos e as limitações de uma conta do WhatsApp Business. Por exemplo, não há atualização de status nem a capacidade de ter um feed de rolagem de informações que torne mais fácil o compartilhamento pelas pessoas. Dependendo do caminho do usuário no site do projeto, a pessoa chega a um campo para receber atualizações do projeto ou fazer sua pergunta. Nosso objetivo era responder dentro de 24 horas, mas recebemos muitas mensagens e nosso tempo médio de resposta foi de aproximadamente 36 horas. Ao trabalhar com o Zendesk para estabelecer essa integração, muitas das analogias estavam relacionadas a companhias aéreas, já que elas têm sido as maiores adotantes da API do WhatsApp Business. Essas analogias também indicam que nós precisamos de integrações técnicas projetadas especificamente para os desafios do jornalismo.
Representantes do WhatsApp e do Zendesk nos contataram, muitas vezes em finais de semana, para saber como nós estávamos nos dando com a API. A equipe está claramente ciente dos desafios da desinformação que circula na plataforma e vê projetos como o Comprova como uma maneira de ajudar.
Não havia como a equipe do Comprova ter lidado com quase 70 mil mensagens em um único celular, então a API do WhatsApp foi fundamental para as ambições do projeto, que era informar o eleitorado brasileiro. Nós esperamos que o Comprova volte em 2019 mas, enquanto isso, estamos usando a mesma integração da API em nosso mais novo projeto, CrossCheck Nigéria. Nós suspeitamos que o tráfego do WhatsApp na Nigéria irá rivalizar com o do Brasil, mas independentemente do que aconteça, o aprendizado continua.
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