Abraji lista ferramentas úteis para cobrir eleições

A menos de duas semanas do segundo turno das eleições, apostar em apurações com ferramentas acessíveis baseadas em dados pode ser a solução para repórteres que desejam aprofundar o debate sobre os candidatos nesta reta final. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) destaca cinco caminhos de investigação que podem gerar matérias exclusivas sobre partidos e os 26 nomes que ainda seguem na disputa pelo cargo público.

Pinpoint

Iniciativa do Google, o Pinpoint é uma ferramenta gratuita que facilita a pesquisa de jornalistas em arquivos de texto e áudio. Qualquer pessoa que tenha uma conta no Gmail pode acessá-lo. Ele permite identificar automaticamente nomes de pessoas, instituições e locais mencionados nos arquivos e realizar transcrições de áudios.

Desde ago.2021, a Abraji, curadora da projeto no Brasil, disponibiliza coleções com documentos de interesse público na plataforma. As duas últimas remessas de publicações têm como foco ajudar repórteres na cobertura das eleições. Entre as coleções públicas, constam na plataforma as pesquisas eleitorais realizadas em ago.2022 e as certidões criminais que os candidatos apresentaram neste processo eleitoral.

Coleções antigas publicadas pela Abraji também podem render boas pautas. Nesta semana, matéria do Estadão consultou a coleção que reúne transcrições de lives feitas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, e descobriu que a expressão “pintou um clima” não está registrada nos documentos. A declaração polêmica de Bolsonaro sobre meninas venezuelanas repercutiu de forma expressiva nas redes sociais e foi utilizada contra o presidente, que teve sua imagem associada à pedofilia por críticos e opositores.

Um outro benefício do Pinpoint é que os usuários também podem criar coleções de documentos particulares para realizar suas pesquisas.

Por meio das matérias publicadas mensalmente que descrevem as novas coleções, a Abraji oferece ainda dicas aos repórteres sobre como usar o Pinpoint. Na última, por exemplo, os jornalistas do projeto, Alice de Souza e Eduardo Goulart de Andrade, explicaram como os usuários poderiam usar os operadores de busca avançada da plataforma para descobrir se determinado candidato respondia a algum processo judicial.

Confira também esta live com Reinaldo Chaves, coordenador de projetos da Abraji e Eduardo Goulart de Andrade, com dados gerais sobre a ferramenta.

Dúvidas e comentários sobre o trabalho desenvolvido pela Abraji no Pinpoint, além de sugestões de novas coleções, podem ser encaminhados para [email protected]

CruzaGrafos

Permitir verificações cruzadas e investigações avançadas de dados é a proposta do CruzaGrafos, uma parceria da Abraji e do Brasil.IO. O projeto reúne diferentes bases de dados públicas e possibilita ao usuário visualizar as ligações entre políticos/candidatos, empresas, documentos e outras informações em uma espécie de teia.

Recentemente, o CruzaGrafos atualizou e incorporou uma série de recursos e informações. Confira algumas possibilidades da ferramenta:

Procurar todas as empresas ligadas a um político/candidato a cargo público nas quais ele seja sócio ou administrador;
Nessas empresas, ver quais são os demais sócios;
Verificar a rede de proximidade desses sócios, isto é, de quais outras empresas eles são sócios e os demais sócios em diferentes graus de proximidade;
Descobrir se o caminho que separa uma pessoa/empresa de outra pessoa/empresa é curto ou se existe realmente;
Tendo de antemão a lista de parentes ou assessores de políticos ou de pessoas de interesse público, saber se eles têm empresas (tática comum para encobrir patrimônio);
Verificar se o político/candidato nas eleições tem empresas de ramos econômicos possivelmente conflitantes com seu cargo público;
Saber se um político/candidato ou pessoa de interesse público tem várias empresas em seu nome do mesmo ramo e/ou com nomes semelhantes (tática que poderia ser usada para lavagem de dinheiro, por exemplo);
Saber os autos de infração ambiental de um empresário, político ou empresa inscrito no Ibama;
Conhecer a evolução ou não de patrimônio de um político desde 2014;
Saber se um empresário, político ou empresa tem contratos, sanções ou pagamentos com o governo federal;
Conhecer a imagem de fachada de uma empresa, cadastrada no Google Maps;
Conhecer os processos judiciais de interesse público em que um político é parte.

A ferramenta é gratuita para associados à Abraji (veja como se associar aqui). Pessoas não associadas ainda podem ter acesso. Elas devem responder a um formulário e atender aos seguintes critérios: não possuir vinculação profissional dependente exclusivamente com partidos políticos, com algum órgão de um dos poderes Executivo e Legislativo ou com entidades que promovam lobby empresarial; estar de acordo com os Termos de Uso do projeto; e estar de acordo com nossa Política de Privacidade.

Confira nesta matéria mais informações sobre a nova versão do CruzaGrafos, além de dicas de como usá-lo em apurações jornalísticas.

Publique-se

Com o Publique-se, iniciativa em parceria com a Transparência Internacional - Brasil e a Digesto/Jusbrasil, é possível verificar quais processos judiciais de interesse público citam políticos como partes. Repórteres que estejam investigando candidatos a cargos públicos podem acessar as movimentações processuais e os principais dados dos processos, bem como o ID único para consulta nos sites dos tribunais e um link direto do processo na Jusbrasil.

O projeto reúne atualmente mais de 7 mil processos judiciais do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e da Justiça Estadual, Federal e do Trabalho.

Ctrl+X

Monitoramentos da Abraji acerca da situação da liberdade de expressão e de imprensa e do acesso à informação no Brasil e estudos da rede Voces del Sul sobre o mesmo tema têm demonstrado o papel de agentes do Estado nas violações contra jornalistas e a imprensa, dentre elas a censura e o assédio judicial.

Para jogar luz sobre a problemática, a Abraji desenvolveu em 2020 o projeto Ctrl+X, cuja versão atual possibilita identificar políticos e figuras públicas que estejam utilizando o Judiciário para atacar, perseguir e intimidar profissionais de imprensa.

Hoje, com mais de 5 mil ações, além de agregar processos judiciais contra jornalistas e veículos que solicitam a retirada de conteúdo de ambiente on-line, o Ctrl+X registra os que não necessariamente demandam a remoção do conteúdo. A ferramenta também passou a permitir que usuários filtrem as ações que pedem indenizações, as que são diretamente contra pessoas, e as que têm origem nos Juizados Especiais Cíveis e as criminais.

Repórteres que buscam indícios de comportamento abusivo de políticos contra a imprensa podem ter o Ctrl+X como uma de suas ferramentas aliadas.

Aleph

Ferramenta criada pelo OCCRP (Organized Crime and Corruption Reporting Project), consórcio internacional de jornalismo investigativo, o Aleph agrupa mais de 500 bases de dados que podem ser cruzadas entre si. Em live de jun.2022, representantes das duas organizações mostraram as bases de dados inéditas do repositório, disponibilizadas graças a uma parceria entre a Abraji e o OCCRP, e mostraram casos reais práticos do uso do Aleph para investigações jornalísticas.

Intitulado “project_abraji”, o diretório do Aleph fruto da parceria agrupa uma série de dados do Brasil, dentre eles os relativos a beneficiários do Auxílio Emergencial e do Bolsa Família; proprietários de aeronaves, doadores e fornecedores de campanha eleitoral, gastos com cota parlamentar de senadores e deputados, bens de candidatos registrados em eleições, candidaturas eleitorais e embargos ambientais.

O Aleph reúne informações do tipo “follow the money” (siga o dinheiro, na tradução para o português) de 139 países, isto é, bases de dados e documentos para rastrear ativos e propriedades corporativas, gastos governamentais e informações sobre indivíduos e grupos de interesse jornalístico.

Por meio da plataforma, é possível encontrar registros de empresas, aquisições, pessoas de interesse público, diários oficiais, arquivos de tribunais, licenças e concessões, grey literature (documentos e pesquisas produzidos por organizações fora dos canais tradicionais de publicação), arquivos de notícias, registro de terras, listas de sanções, registros financeiros, regulatórios, aéreos, marítimos e documentos de bibliotecas.

O acesso básico ao Aleph é gratuito, e somente jornalistas investigativos, pesquisadores acadêmicos e ativistas podem acessar informações mais sensíveis do projeto. Veja como se cadastrar aqui.

Outros recursos

Em jul.2022, a Abraji disponibilizou na seção Help Desk de seu site a tradução do Guia de Eleições para Repórteres Investigativos, da Global Investigative Journalism Network (GIJN). Escrito pelo repórter da GIJN Rowan Philp, o manual traz ferramentas, técnicas e recursos para facilitar a cobertura do tema.

O guia está dividido em quatro capítulos:

Foto de capa: Cytonn Photography/Unsplash