Terceiro painel de seminário on-line aborda desafios no combate à desinformação durante a pandemia
  • 12.05
  • 2020
  • 16:43
  • Abraji

Acesso à Informação

Terceiro painel de seminário on-line aborda desafios no combate à desinformação durante a pandemia

O terceiro e último debate do seminário internacional sobre liberdade de imprensa e pandemia, organizado pela Abraji e pela Embaixada dos Estados Unidos, mostrou como a desinformação se tornou não apenas um problema do jornalismo, mas da sociedade. E também como o jornalismo pode sair da pandemia mais fortalecido, por meio da colaboração.

Cailin O'Connor, coautora do livro “A Era da Desinformação”, abriu os debates contextualizando o momento atual, no qual há muita pressão do ponto de vista científico para encontrar respostas à doença. O problema é que a “ciência rápida” pode ser ruim. “Às vezes, os cientistas comunicam aos jornalistas estudos que nem sequer foram validados", disse ela, citando a informação publicada de que a covid-19 tinha sido criada em laboratório. Apesar dos desmentidos, ela continuou circulando.

"Recordo também que uma revista científica de prestígio, a New England Journal of Medicine, publicou um estudo sobre um chinês assintomático que teria contaminado quatro alemães. A informação estava errada. Mas foram milhares de tweets reproduzidos, que viraram milhões”, relembrou O'Connor.

A filósofa norte-americana especializada em modelos de interação social cunhou o termo informação “zumbi”, aquela que está viva, apesar de morta. “O problema é que mesmo depois que o conteúdo é refutado, é impossível contê-lo”. A professora associada de Lógica e Filosofia da Ciência do Instituto de Ciência Comportamental e Matemática da Universidade da Califórnia elencou fatores a ser considerados antes de publicar uma reportagem:

  • Cuidado com descobertas não fundamentadas; 
  • Converse com outros pesquisadores que possam identificar erros de metodologia;
  • Não se concentre em estudos individuais, mesmo que o autor seja famoso;
  • Ressalte as incertezas dos estudos para não cravar algo só para atrair a audiência; 
  • Fuja de estudos extremos em busca de furo;
  • Admita seus erros.

Cristina Tardáguila, diretora-adjunta da Rede Internacional de Checagem de Notícias (IFCN, na sigla em inglês), contou que começou a verificar conteúdos enganosos em 24.jan.2020, quando a covid-19 tinha matado 17 pessoas. Desde então, a  IFCN contabilizou 5.500 desinformações, vindas de 88 agências de checagem de notícias em 74 países, em 43 idiomas. “É desanimador saber que ainda circula por aí que a origem do novo coronavírus é uma sopa de morcego ou que tenha sido uma invenção de Bill Gates. Parece que a gente enxuga gelo”, disse a brasileira.

Tardáguila mencionou seis “ondas” de desinformação desde que a primeira morte foi registrada, na China, no fim de dezembro. Cada uma com uma característica diferente. Interessante notar, diz, como foi a adequação cultural entre os países que mais produzem esses conteúdos suspeitos. E que as notícias de falsa cura estão entre as mais difíceis de ser debeladas. “Fica evidente como os políticos produzem desinformação. Na nossa base de dados, temos 61 peças envolvendo Donald Trump; 17 são frases ditas pelo presidente norte-americano”, contou Tardáguila.

Sergio Lüdtke, editor do projeto Comprova, coordenado pela Abraji e que reúne jornalistas de 24 diferentes veículos de comunicação brasileiros para verificar boatos sobre a covid-19, falou sobre o contexto da desinformação no Brasil. “A questão econômica deixa as pessoas mais ansiosas sobre o que vai acontecer daqui para frente”, explicou. Segundo Lüdtke, uma das estratégias do Comprova tem sido contextualizar por qual motivo os jornalistas estão verificando aquela notícia, deixando claro para os leigos como isso pode causar danos. “Estamos fazendo uma conexão necessária com o público”.

O presidente da Abraji, Marcelo Träsel, que mediou o debate, mencionou as iniciativas no Brasil e no mundo para criminalizar as chamadas “fake news” e seus riscos para a democracia. “A IFCN é contra qualquer tentativa de criar uma lei assim. Se nem sequer conseguimos definir o que são ‘fake news’, não pode haver uma lei punitiva. Qualquer legislação levaria à autocensura e depois à censura”, pontuou Cristina Tardáguila.

Em resposta à audiência, que perguntou sobre os primeiros passos para se tornar um verificador de informação e combater a desinformação, os participantes listaram os seguintes pontos:

  • Curiosidade. Algo que move todo jornalista, e também o checador de notícias. “Duvide de tudo”;
  • Estudar o funcionamento das plataformas e ferramentas de mídia;
  • Levar a checagem de fatos a escolas e universidades, fortalecendo as habilidades do cidadão digital, que deve saber realizar checagens simples;
  • Ao falar de fatos científicos, conversar com diversos cientistas e não confiar em apenas uma fonte. 

Todos os painéis ficarão disponíveis no site da embaixada americana a partir desta quarta-feira (13.mai.2020), durante uma semana. O evento on-line também recebeu apoio da Associação Nacional de Jornais (ANJ), da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), do Instituto Palavra Aberta e do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor).  
 

:: Confira também a cobertura do painel sobre o futuro dos meios de comunicação após a pandemia ::

Assinatura Abraji