Ataques contra mulheres jornalistas crescem 250% em setembro
  • 11.10
  • 2022
  • 14:25
  • Rafaela Sinderski

Liberdade de expressão

Ataques contra mulheres jornalistas crescem 250% em setembro

Setembro estabeleceu um novo recorde para ataques a mulheres jornalistas em 2022: foram registrados 28 alertas ao longo do mês, quase um por dia. O número representa um terço do total de casos contra comunicadoras registrados em todo o ano e um aumento de 47,7% em comparação com set.2021. Os dados resultam dos monitoramentos de ataques gerais e de violência de gênero contra jornalistas, ambos realizados pela Abraji.

A maioria dos ataques está relacionada à turbulência no cenário político brasileiro, que se acentuou durante o período eleitoral. Entre agosto e setembro, a violência contra as profissionais de imprensa cresceu 250%. Não à toa, 64,3% dos casos estavam diretamente conectados à cobertura eleitoral e 50% das agressões tiveram a participação de agentes políticos e estatais. 

Em setembro, por exemplo, Jair Bolsonaro (PL) teve um comportamento machista com Amanda Klein durante sabatina no Jornal da Manhã, da Jovem Pan. O presidente, que concorre à reeleição, mencionou a vida pessoal da jornalista ao ser questionado sobre os imóveis adquiridos por seus familiares com dinheiro vivo. Depois do episódio, Klein passou a sofrer ataques de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais.

Algo similar aconteceu com Juliana Dal Piva, do UOL: após a publicação da reportagem investigativa sobre o patrimônio imobiliário da família Bolsonaro, a profissional, que é uma das autoras da matéria, foi alvo de comentários misóginos na internet. Em uma dessas publicações, feita no Twitter, o agressor sugeriu que o trabalho jornalístico de Dal Piva era resultado da “falta de sexo” em sua vida.

A violência verbal foi um recurso bastante utilizado para desmoralizar e descredibilizar comunicadoras ao longo do mês. Em 67,9% dos episódios identificados em setembro, as vítimas sofreram com discursos estigmatizantes. O papel das redes sociais nesse quadro de violências fica claro com este dado: 64,3% do total de casos teve origem ou repercussão no ambiente on-line. Ou seja, o que aconteceu com Amanda Klein e Juliana Dal Piva se repetiu com outras jornalistas.

Mas as agressões não se restringiram ao espaço virtual. 21,4% dos alertas que vitimaram mulheres em setembro de 2022 foram classificados como casos de ameaça, intimidação e/ou violência física. Um exemplo que se encaixa nessa categoria envolve a repórter Lais Alegretti, da BBC Brasil, que foi uma das profissionais hostilizadas ao cobrir a visita do presidente Jair Bolsonaro a Londres para o funeral da rainha Elizabeth II. A jornalista Alana Rocha, de Riachão do Jacuípe (BA), também sofreu intimidação ao tentar realizar seu trabalho. Foi atacada por um vereador de sua cidade dentro da Câmara Municipal, durante a cobertura de uma sessão legislativa. No mesmo episódio, ela foi vítima de transfobia.

Em seus monitoramentos, a Abraji também registra a violência de gênero sofrida pelas jornalistas e por profissionais da imprensa de modo geral – considerando situações de transfobia, homofobia e comentários ou comportamentos explicitamente machistas. Dos casos que vitimaram mulheres em setembro, 39,3% foram classificados dessa forma. Dois deles foram considerados episódios de violência sexual, com importunação sexual e ameaça de estupro.

Ataques gerais à imprensa no Brasil

O número alarmante de ataques contra comunicadoras em setembro de 2022 acompanha outro resultado, também preocupante: o crescimento das agressões contra jornalistas, meios de comunicação e imprensa como um todo. A Abraji identificou 84 casos ao longo do mês. Isso representa um aumento de 50% em relação a setembro de 2021. Foram 66 alertas de discursos estigmatizantes (78,6% do total), categoria que segue como a principal forma de violência direcionada à mídia brasileira e a seus profissionais.

De janeiro ao fim de setembro deste ano, há o registro de 418 ataques. O crescimento é de 19,8% em comparação com o mesmo período do ano passado.

Em 2022, os episódios de agressão se concentraram, sobretudo, no dia 7 de setembro, Bicentenário da Independência do Brasil (7 casos), e no dia 19 de setembro, dia do funeral da rainha Elizabeth II (7 casos). As datas dos últimos debates presidenciais transmitidos pelo SBT (24.set.2022) e pela Globo (29.set.2022) também foram marcadas por um número alto de ataques: 5 e 6 casos, respectivamente.

Agressões de presidenciáveis

Durante o período de campanha para o primeiro turno das eleições, a Abraji acompanhou as manifestações dos candidatos à presidência, a fim de identificar ataques a jornalistas, meios de comunicação e imprensa. Entre 16.ago.2022 e 1.out.2022, foram registrados 51 casos de agressão envolvendo presidenciáveis, todos classificados como discursos estigmatizantes.

O atual presidente Jair Bolsonaro (PL) participou de 50,1% desses episódios. Em segundo lugar, está Sofia Manzano (PCB), com 15,7%, que acusou, em suas redes sociais, veículos de comunicação de propagarem fake news e boicotarem sua candidatura. A análise foi feita a partir de declarações dos postulantes, de suas participações em debates e de postagens em seus perfis na internet.

 

Em agosto, logo no início oficial da campanha eleitoral, 11 organizações ligadas à liberdade de imprensa – entre elas a Abraji – enviaram uma carta compromisso aos candidatos e candidatas à presidência da República. O documento pedia que os postulantes, seus partidos e coligações se comprometessem com a defesa de condições livres e seguras para a atividade jornalística durante o período de eleições. 

Entre as recomendações apresentadas no documento, foi pedido que os presidenciáveis condenassem publicamente qualquer forma de violência contra jornalistas, comunicadores/as e imprensa em geral, e que não estimulassem, direta ou indiretamente, ofensas e ataques.

Lula (PT), Ciro Gomes (PDF), Simone Tebet (MDB), Léo Péricles (UP), Sofia Manzano (PCB) e Vera Lucia (PSTU), candidatos que disputaram o primeiro turno, firmaram o compromisso. Somente Jair Bolsonaro (PL), que disputa o segundo turno com o ex-presidente Lula, não se manifestou sobre a adesão ao documento.

Assinatura Abraji