Abraji registra 385 bloqueios a jornalistas por autoridades públicas no Twitter
  • 11.11
  • 2022
  • 13:48
  • Caê Vatiero

Liberdade de expressão

Acesso à Informação

Abraji registra 385 bloqueios a jornalistas por autoridades públicas no Twitter

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) atualizou os dados do monitoramento de jornalistas bloqueados por autoridades públicas no Twitter, projeto que realiza desde set.2020 com apoio da Open Society Foundations. Até esta sexta-feira (11.nov.2022), foram registrados 385 bloqueios a profissionais de imprensa. O monitoramento aponta que ao menos 192 jornalistas de todo o país foram impedidos de acessar as contas de parlamentares, ministros, prefeitos e/ou do presidente da República. 

O presidente Jair Bolsonaro (PL) continua liderando o ranking de 52 autoridades que realizam bloqueios na plataforma, com 104 restrições. Em segundo lugar, está o ex-secretário especial da Cultura, Mário Frias, com 43 blocks, seguido do ex-ministro da educação, Abraham Weintraub, com 42. Somados, os vetos perpetrados pelos três representam 49% do total de bloqueios mapeados pela Abraji.

A Abraji passou a registrar de forma contínua os bloqueios de agentes públicos após identificar em um levantamento, realizado em mai.2020, que esta era uma prática recorrente contra os profissionais de imprensa. Os casos são contabilizados por meio de busca ativa por palavras-chave e coleta de respostas neste formulário.

A maioria dos profissionais relata que o veto é uma resposta aos questionamentos e críticas postados com menções aos perfis das autoridades - desde um retuíte até a publicação de uma reportagem. Outra parcela significativa de repórteres, colunistas e editores não sabe o motivo do bloqueio. O impeditivo dificulta a apuração de jornalistas que recorrem, especialmente em períodos eleitorais, às redes sociais de políticos para acompanhar as manifestações oficiais dos postulantes aos cargos públicos. 

A jornalista e idealizadora do ProIndígenas, Juliana Lourenço, foi bloqueada por cinco autoridades públicas no Twitter. Ela comenta que o bloqueio do presidente, em set.2022, impactou na sua cobertura durante as eleições. “É como se eu estivesse procurando informações no escuro. Tive que recorrer ao perfil Desbloqueando Bolsonaro que posta os mesmos tuítes dele para quem é bloqueado”, contou Lourenço.

Para Fernanda K. Martins, antropóloga e diretora do InternetLab, o trabalho jornalístico desenvolvido nas redes sociais, sobretudo no Twitter, possui um papel significativo no compartilhamento de informações. “Assim como os políticos têm uma responsabilidade sobre o que é dito e veiculado, os jornalistas também têm uma função que é bastante pública e social sendo desempenhada ali. Então, não dá para tratar a conta de um jornalista como uma conta de um usuário qualquer”, explica. 

A escalada de violações contra jornalistas

Ao passo que as violações de liberdade de expressão e de imprensa e ao direito de acesso à informação crescem no ambiente digital, jornalistas enfrentam uma crescente de ataques físicos no Brasil. O presidente Jair Bolsonaro (PL) aparece como o primeiro na lista de autores de ataques desde 2019, segundo o relatório Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil, organizado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).

Em 2020, Bolsonaro foi responsável por 175 ocorrências (40,89%) de agressão. Neste mesmo ano, a Abraji registrou o maior  índice de bloqueios contra jornalistas (162). Sozinho, o presidente vetou o acesso de 45 profissionais de imprensa ao seu perfil no Twitter. Já em 2021, ano em que a Fenaj registrou 430 episódios envolvendo o presidente, a Abraji identificou 65 bloqueios.

Das nove autoridades públicas que mais bloquearam jornalistas, cinco constam no ranking de atores estatais que cometeram violência de gênero contra a categoria em 2021. Além do presidente, aparecem na lista os seus filhos Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PL); o ex-secretário Mário Frias; e o ex-presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. 

Em 2022, foram registrados 36 bloqueios a profissionais de imprensa. Os dados do monitoramento apontam que pelo menos 15 jornalistas perderam acesso às contas da família Bolsonaro. Além das tentativas recorrentes de desmonte da transparência pública, jornalistas enfrentaram um aumento expressivo na quantidade de agressões, principalmente em ataques virtuais. Entre jan.2022 e set.2022, a Abraji identificou que de 417 ocorrências, 286 (68,5%) tiveram origem ou repercussão na internet.

A Abraji monitora ataques contra a imprensa brasileira desde 2013. Em 2019, a associação passou a integrar a rede Voces Del Sur, que hoje reúne 16 organizações da sociedade civil em diferentes países da América Latina e Caribe, movidas por um esforço comum de monitorar a situação da liberdade de imprensa na região.

O projeto destaca que a maioria dos episódios de violações à imprensa em 2022 tiveram a participação de agentes públicos. Os membros do clã Bolsonaro somam juntos 212 (77%) ataques contra jornalistas. Além disso, os discursos estigmatizantes consumados nas redes sociais, principalmente no Twitter, também foram identificados como a principal forma de ataque.

Para o próximo ano, Martins avalia que parte do enfrentamento dos discursos de ódio, da violência política e dos ataques contra jornalistas só será possível a partir da regulação das plataformas digitais. “Por mais que as plataformas possam ser bem intencionadas em alguns momentos, nós precisamos de uma regulação para não depender da boa intenção, mas para ter uma legislação que diga como isso deve acontecer”, afirma a antropóloga.  

O Projeto de Lei (2630/2020), que visa estabelecer normas relativas à transparência de redes sociais e de serviços de mensagens privadas, segue em tramitação na Câmara dos Deputados. Além de dispor sobre as responsabilidades atribuídas às plataformas a fim de diminuir a violência digital, o projeto, conhecido como PL das Fake News, considera que as contas de autoridades públicas não poderão restringir a visualização de suas publicações e terão suas informações sujeitas às garantias de acesso à informação. 
 

Assinatura Abraji