Veículos devem adotar transparência radical em ambientes polarizados, diz especialista
  • 04.05
  • 2021
  • 19:20
  • Abraji

Liberdade de expressão

Acesso à Informação

Veículos devem adotar transparência radical em ambientes polarizados, diz especialista

Como os jornalistas podem se preservar em ambientes polarizados? Para Amanda Ripley, repórter premiada do jornal norte-americano New York Times, é preciso ser "radicalmente transparente" sobre os métodos usados na apuração das reportagens. Esse foi um dos temas tratados no segundo painel do Seminário Internacional realizado nesta terça-feira (4.mai.2021) e que marcou o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, celebrado no dia 3 de maio.

O evento foi promovido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), com apoio da Abraji e outras sete organizações envolvidas na defesa da liberdade de imprensa.

O debate “Polarização e Liberdade de Imprensa”, mediado por Guilherme Amado, vice-presidente da Abraji, teve a participação da repórter investigativa e escritora norte-americana Amanda Ripley; do chefe da área de liberdade de expressão e segurança de jornalistas do setor de comunicação e informação da UNESCO, Guilherme Canela; e da âncora da GloboNews, Aline Midlej. 

Tobias Bradford, porta-voz e adido de imprensa da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, abriu o seminário lembrando dos riscos à democracia em todo o mundo e o papel da imprensa durante a pandemia. “Admiramos, respeitamos e apreciamos muito os nossos colegas jornalistas, porque vocês escolheram uma profissão que implica grandes riscos, mas que, ao mesmo tempo, tem grande impacto”. 

Amanda Ripley, autora do livro “High Conflict: Why We Get Trapped and How We Get Out”, ressaltou que, para trabalhar em ambientes polarizados, os jornalistas precisam ser "radicalmente transparentes", ou seja, precisam mostrar aos leitores como obtiveram os dados, por que escolheram determinados caminhos narrativos e a complexidade dos assuntos. “E usar dados para embasar as matérias sempre que possível”, completou. 

Em sua fala, Guilherme Canela refletiu sobre o contexto da Declaração de Windhoek para o Desenvolvimento de uma Imprensa Livre, Independente e Pluralística. O documento firmou o compromisso da comunidade internacional com a liberdade de imprensa, há 30 anos, no momento que supostamente marcava o fim da polarização e o início de um “novo mundo”. 

No entanto, o advento da internet e das redes sociais incluíram desafios e estratégias perigosas para a democracia, a proteção e a promoção dos direitos humanos, como a desinformação, discursos de ódio e teorias da conspiração. “Há uma quantidade quase infinita de bolhas informativas, onde as pessoas se autoalimentam de suas próprias convicções. As pessoas não mantêm um diálogo na esfera pública, onde podem aceitar as regras do jogo, que são ouvir diferentes opiniões, interagir e defender as suas próprias opiniões com base em fatos”.

Lições da polarização

Ao citar os ataques coordenados à imprensa, a âncora do telejornal “Edição das 10h”, da GloboNews, Aline Midlej, trouxe a perspectiva de quem enfrenta um ambiente hostil dentro e fora das redações. “O que a gente vive hoje no país é um retrocesso civilizatório", avaliou. 

Midlej chamou atenção também para o amadurecimento da imprensa durante a pandemia, com a criação, em junho de 2020, de um consórcio inédito de veículos concorrentes para combater a falta de dados do Ministério da Saúde sobre a covid-19. “O consórcio é uma lição, um aprendizado. Mostrou que, quando não nos unimos, fortalecemos o censor”.

A âncora reconheceu o momento histórico para o jornalismo brasileiro:

“Às vezes há uma dificuldade no jornalismo de dar o nome certo às coisas, como fazemos em alguns contextos, como o da violência policial. Quando falamos de abuso policial e, na verdade, o que as imagens mostram é tortura. Quando falamos que é desrespeito uma autoridade mandar um colega calar a boca, eu não sei se desrespeito é a palavra. Não podemos perder a autovigilância. Tenho feito um exercício de não deixar de trazer a criticidade do momento quando ela acontece”.

Nas considerações finais, Guilherme Canela ponderou que é preciso estimular pessoas com opiniões contrárias na busca de construir soluções e na tentativa de criar vasos comunicantes. "Democracia não se trata de consenso, mas de respeitar o dissenso sem violência”.

Assista ao painel aqui:

O primeiro dia de evento 

O painel “Informação como bem público”, da segunda-feira (3.mai.2021), contou com a participação do ministro do STF e presidente do TSE, Luís Roberto Barroso; da ombudsman da Folha de S.Paulo, Flavia Lima; da diretora da UNESCO no Brasil, Marlova Noleto; do presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), Flávio Lara Resende; e da presidente executiva do Instituto Palavra Aberta, Patricia Blanco. A mesa foi moderada pelo presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Marcelo Rech.

O ministro fez uma alerta sobre as ameaças à democracia e a capilaridade da desinformação, afirmando que “a mentira deliberada tem dono”. Para Barroso, há novas ameaças à liberdade de imprensa em 2021, como campanhas difamatórias propagadas e coordenadas por milícias digitais e a censura na esfera privada.

Assista ao primeiro painel do seminário:

O Seminário Internacional foi promovido pela UNESCO Brasil, com apoio da Abraji,  Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), Instituto Palavra Aberta, Folha de S. Paulo, Embaixada e Consulados dos Estados Unidos no Brasil.

 

Assinatura Abraji