• 08.01
  • 2015
  • 15:54
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Tecnologia, inovação e mídia em 2014: panoramas brasileiro e mundial

O ano passado foi fértil no que diz respeito à implementação de novas tecnologias no jornalismo e à criação de novas mídias. A jornalista Maite Fernandez fez uma lista das 10 ocorrências mais importantes no jornalismo mundial para o site IJnet.

No Brasil, uma das mudanças mais evidentes para o jornalismo foi a incorporação do WhatsApp nas redações. A novidade, além de gerar um contato maior entre público e jornal, também auxilia na procura e no desenvolvimento de pautas, e facilita a comunicação interna (entre os repórteres) e externa (com o leitor, ouvinte ou telespectador). Algumas das mídias que já estão usando essa tecnologia são os jornais Extra, Correio do Povo, Folha de S.Paulo e as Rádios Bandeirantes, Bandnews FM, Bradesco Esportes FM e Jovem Pan AM. Uma iniciativa que ganhou notoriedade foi a criação de uma rede de colaboração no WhatsApp para repórteres que cobrem o narcotráfico na América Latina, a Narcosul, pelo Extra.

Ainda como destaque tecnológico, Gustavo Faleiros, ex jornalista de O Eco, ganhou o Google Challenge para desenvolver um projeto que visa a criação de um hardware capaz de medir a qualidade da água na Amazônia, e também em São Paulo. Faleiros pretende usar os dados coletados para produzir reportagens sobre as regiões.

Durante as eleições presidenciais deste ano, outros dois projetos inovadores que tiveram importância no cenário jornalístico foram Truco!, da Agência Pública, e Preto no Branco, de O Globo, que mostraram se as afirmações e os dados repetidos pelos candidatos durante a propaganda eleitoral ou discursos eram verdadeiros ou não. 

Também em 2014, foi lançado o projeto O Sujeito, canal do Catarse que pretende gerar, através de crowdfunding, um financiamento coletivo para o jornalismo independente. O Fluxo, fundado por Bruno Torturra, fez uma campanha de doações e entrou em operação produzindo vídeos. Outras novidades de 2014 foram a Jota, portal alternativo que cobre, principalmente, fatos ligados ao sistema judiciário, e a Ponte, projeto incubado pela Pública que se dedica à cobertura de segurança pública.

A Abraji abordou os temas relacionados à tecnologia e às novas formas de lidar com o jornalismo em seu 9º Congresso, realizado em julho do ano passado, com painéis e cursos como: Busca Avançada no Google e Google Trends: O que os jornalistas devem saber; Desenvolvimento de estratégias digitais; Jornalismo para plataformas móveis: estratégia e inovação; Minerando dados com a plataforma do Twitter; Conhecendo as ferramentas de mapas do Google; Crowdfunding para financiar reportagens de fôlego; YouTube + VICE News: Construindo uma identidade digital e global de jornalismo; e Estratégias digitais para um futuro do jornalismo.

 

Abaixo, a lista de Maite Fernandez:

 

1- Vazamento do relatório de inovação do New York Times. A publicação de um relatório interno de 96 páginas em maio mostrou ao mundo os problemas que o jornal está passando para se adaptar aos meios digital e móvel.

O relatório detalhou os problemas na estratégia de mídia social do New York Times, como a cultura tradicional da redação se chocando com a equipe digital, e como o jornal está ameaçado por concorrentes mais enxutos e experientes digitalmente, a exemplo do BuzzFeed, Circa e Vox.

A equipe que elaborou o relatório recomendou retirar a ênfase na imprensa, criar uma unidade de estratégia de redação e fazer um esfoço maior para atrair os melhores talentos digitais.

Somando-se a este cenário de instabilidade, o relatório foi publicado pelo BuzzFeed dois dias depois que o New York Times anunciou a demissão da editora-executiva, Jill Abramson, embora sua saída não fosse diretamente relacionada às dificuldades digitais do jornal. 

 

2- O Washington Post é liderado por Bezos. Mais de um ano depois que o fundador da Amazon, Jeff Bezos, comprou o Washington Post, parece que as coisas vão bem para a organização de notícias. O Post contratou mais de 100 funcionários no ano passado, ganhou dois prêmios Pulitzer, e teve o maior tráfego de sua história em julho. E Bezos parece estar pensando em novas fontes de receita: segundo o Business Insider, o jornal planeja licenciar seu content management system (CMS) para jornais locais e regionais.

 

3- Distribuição de notícias e a opacidade dos algoritmos. Em agosto, enquanto os protestos em Ferguson, no Missouri, dominavam o Twitter, outros perceberam que havia uma realidade muito diferente no Facebook, com vídeos do Desafio do Balde de Gelo, fotos de bebês e anúncios de casamento.

Isso gerou perguntas sobre como os algoritmos escolhem o conteúdo que vemos e portanto a realidade que vivemos. Se plataformas de redes sociais como o Facebook dominam a distribuição de notícias hoje, as pessoas não deveriam saber como funcionam os algoritmos e por que eles escolhem certas coisas em vez de outras?

Isso mostrou como a relação entre as empresas de jornalismo e tecnologia ainda está um pouco tensa, e as tensões surgem quando empresas de tecnologia assumem mais funções que costumavam ser exclusivas da imprensa. 

Duas boas leituras sobre o tema são What’s the right relationship between technology companies and journalism?, de Emily Bell, e a resposta de Dave Winer, How to Rebuild Journalism

 

4- Ser mulher em tecnologia e mídia continua sendo difícil. A demissão de Jill Abramson do New York Times levantou a questão do sexismo e igualdade de gênero na mídia enquanto o #gamergate mostrou como as mulheres na área de tecnologia e mídia online ainda são atacadas diariamente.

Entretanto, uma coisa boa aconteceu em  2014: o Twitter finalmente implementou mudanças para diminuir ataques online.

 

5- O podcast Serial é viral. Produzido pelo programa This American Life, o Serial cuidadosamente dissecou o processo contra Adnan Syed, condenado a matar sua ex-namorada em Baltimore no ano de 1999, provando que o formato de áudio também pode ser viral, e dando uma nova esperança à rádio pública em distribuição e captação de recursos. Podcasts ganharam um fôlego novo. Apesar do final da série ter nos deixado debatendo quem matou Hae por dias a fio, os produtores anunciaram que o podcast vai ter uma nova temporada no ano que vem. 

 

6- Boletins de notícias voltam a ficar na moda. Embora todo mundo pareça reclamar sobre a sobrecarga de e-mails, o ano de 2014 viu a ascensão do boletim por e-mail. Para reduzir o barulho e voltar ao sentimento perdido de personalização, parecia que qualquer um com coração batendo e uma conexão com a Internet teve um boletim informativo em 2014. 

 

7- Mobile e social não param e não vão parar. Para muitas organizações de notícias, o número de acessos em dispositivos móveis ultrapassou os acessos em computadores, e a mentalidade "mobile-first" tornou-se o novo lema. A Copa do Mundo foi o evento mais compartilhado nas redes sociais, mostrando como vivemos eventos em massa como um coletivo nos dias de hoje. 

 

8- Medindo impacto: a estratégia de cliques dando lugar a tempo gasto no site e engajamento. As organizações de mídia estão tentando descobrir a melhor maneira de medir impacto, mas uma coisa parece certo: estão se preocupando menos com cliques e visualizações de páginas e favorecendo outras métricas de engajamento, como o tempo gasto no site. Upworthy, YouTube, Medium e Chartbeat são alguns exemplos de sites que buscam medir o engajamento do usuário

 

9- Jornalistas experimentam "wearables". Embora ainda seja uma tecnologia emergente, repórteres estão cada vez mais experimentando com wearables.

Tim Pool, famoso por cobrir eventos ao vivo com um relógio inteligente e Google Glass para o Vice Media, foi contratado recentemente para liderar uma unidade de notícias urgentes na Fusion, um canal de TV com foco na geração do milênio. Ao mesmo tempo, o professor Robert Hernandez começou seu primeiro curso de jornalismo usando Glass na USC Annenberg.

E a compra de Oculus Rift por parte do Facebook deixou as pessoas imaginando como a realidade virtual pode ser usada além de vídeo games.

 

10- Empreendedores de mídia testam o terreno. Nem tudo foi super deprimente para o jornalismo este ano: uma série de novos empreendimentos de mídia foram lançados, enquanto outras empresas de mídia conseguiram se expandir e gerar milhões de dólares.

The Marshall Project, Ebola Deeply, Vox.com e FiveThirtyEight são alguns dos sites que se sobressaíram no ano que passou. Ao mesmo tempo, Vice Media e BuzzFeed expandiram e fizeram mais dinheiro, enquanto a Fusion contratou um time de estrelas digitais. First Look Media, que virou notícia por má gestão e por saídas antecipadas de alguns de seus contratados mais proeminentes, lançou The Intercept, fundado por Glenn Greenwald, e Reported.ly, um projeto de reportagem com base em redes sociais liderado por Andy Carvin.

Em uma nota triste, o site Homicide Watch, que desde 2010 documenta assassinatos em Washington e foi pioneiro de um modelo de reportagem novo, vai fechar.

Assinatura Abraji