• 16.11
  • 2006
  • 10:35
  • Belisa Figueiró

Repórter monta banco de dados de operações da PF

No dia 12 de novembro, o jornal O Globo publicou uma reportagem inédita sobre as operações mais importantes da Polícia Federal desde 2003. No texto “Mais de 94% dos presos pela PF já foram soltos”, o repórter Jailton de Carvalho mostrou que das 785 pessoas detidas em 20 grandes operações de combate à corrupção e ao crime organizado nos últimos quatro anos, apenas 40 permanecem presas. Entre as operações mais conhecidas estão Anaconda, Prada do Egito, Shogun, Farol da Colina, Cavalo de Tróia, Poeira no Asfalto e Curupira. O levantamento de Carvalho relacionou as informações dos bancos de dados públicos na internet da PF, do Ministério Público e do Judiciário. Confira a entrevista com o repórter:

Há quanto tempo você investiga as operações da Polícia Federal?
Cubro a PF desde 1996, mas passei a acompanhar de perto as grandes operações desde o início delas, em 2003. Antes de entrar para O Globo, em 2000, trabalhei no Jornal do Brasil, Correio Braziliense, Zero Hora e Jornal da Bahia, em Salvador.

Como você fez o levantamento dos dados?
Os dados foram todos retirados dos arquivos da Polícia Federal, Ministério Público e do Judiciário através dos sites, na internet. Com esse levantamento, cruzei as informações de todas as operações desde 2003 — foram 241 —, destacando as 20 mais importantes e acompanhando os desdobramentos de cada uma delas. As informações estavam muito descentralizadas e o meu trabalho foi juntar tudo isso. No site da PF, tem o nome, a data e o número de presos de cada operação. Tive que conferir se aquelas pessoas ainda estavam presas até hoje e, para isso, cruzei os inquéritos com as denúncias e as sentenças. Tive ainda que verificar se as investigações resultaram em denúncias, se as denúncias resultaram em processos, se os processos resultaram em condenações. Foi um trabalho longo.

E qual foi a sua metodologia de trabalho? Primeiro cruzava os dados para depois entrevistar as fontes ou partia de algum ponto da entrevista para relacionar as informações?
Primeiro fiz um corte e separei as 20 principais operações da PF. Depois passei a fazer as pesquisas nos tribunais, nas procuradorias da República e na polícia. Ao final, fiz uma análise do problema a partir de entrevistas com pessoas que conhecem de perto as investigações.

Além das informações das planilhas de banco de dados, quais foram suas outras fontes?
Entrevistei juízes, delegados e procuradores. Alguns estão citados na reportagem como os juízes Julier Sebastião, da Justiça Federal do Mato Grosso, Sérgio Mouro, da Justiça Federal do Paraná. Também estão citados o procurador da República Mário Lúcio de Avelar e o delegado da PF, Jorge Pontes. Mas entrevistei várias outras pessoas que não aparecem no texto.

Depois desse trabalho, como você vê as operações ocorridas durante o governo Lula, que as considera um feito inédito de combate à corrupção no Brasil?
A PF está fazendo um trabalho inédito e muito importante. Até 2002, a instituição estava quase toda direcionada para o combate ao narcotráfico. A corrupção era investigada de forma pontual. Com a chegada do delegado Paulo Lacerda ao comando, a estratégia mudou radicalmente. A PF mudou o enfoque e passou a priorizar o combate à corrupção. A polícia também passou a fazer investigações mais longas. Parece simples, mas é essa mudança que tem permitido a prisão de quadrilhas de 50 a 100 pessoas, inclusive figurões da política e do meio empresarial.

Mesmo com esse avanço surpreendente, como você explica a própria estatística da matéria, que 94% dos presos já foram soltos? O que ainda está faltando para tornar a PF mais sólida? 
O Ministério Público e a Justiça Federal estão tendo dificuldades em absorver o grande volume de informações produzidas pela PF. Procuradores e juízes ganham bons salários, mas dispõe de precária estrutura de trabalho. Em alguns casos, quando os escândalos estão longe dos holofotes, delegados, procuradores e juízes perdem um pouco do ímpeto da investigação. Acho também que falta entrosamento entre delegados e procuradores. Eles têm atribuições complementares mas, muitas vezes, a interação é prejudicada pela competição. Mas o maior obstáculo para a punição ainda é a legislação. O Código Processo Penal tem muitas brechas que permitem aos bons advogados adiar indefinidamente os processos contra clientes endinheirados.


 

Assinatura Abraji