- 10.04
- 2021
- 10:44
- Caê Vatiero*
Rádio comunitária é invadida; comunicador sofre ameaças em PE
Na noite da terça-feira passada (06.abr.2021), a Rádio Comunidade, localizada em Santa Cruz do Capibaribe, em Pernambuco, foi invadida por quatro homens que se declararam apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. O radialista Júnior Albuquerque vinha sofrendo ameaças depois de ter se manifestado contra a conduta do governo federal no enfrentamento da pandemia.
Segundo o Boletim de Ocorrência registrado na 17ª Delegacia Seccional do município, os suspeitos invadiram o estúdio da rádio comunitária, por volta das 19h15, para protestar contra as opiniões do radialista, ameaçando bater na equipe após o fim do programa. Um deles chegou bem perto do comunicador e retirou a máscara, enquanto os demais profissionais tentavam afastá-lo da mesa de gravação.
“Eles chegaram de surpresa. Um deles começou a me ameaçar dizendo que iria me bater, que Bolsonaro não era genocida, nem assassino, e que iria esperar o programa acabar para me pegar fora da rádio”, afirmou Albuquerque.
Toda a ação foi gravada pelos próprios suspeitos, que divulgaram as imagens nas redes sociais.
Ainda segundo o radialista, os homens que invadiram o programa podem fazer parte de um grupo que já havia enviado ameaças à emissora depois de Albuquerque ter dito que, assim como os apoiadores de Hitler possuíam uma parcela de culpa no genocídio na Alemanha, os eleitores de Bolsonaro que concordam com a política sanitária vigente também entrarão para a história como culpados.
Albuquerque contou que as mensagens via WhatsApp já tinham um tom intimidatório e anunciavam a intenção de invadir a sede da rádio. Numa delas, o comunicador é chamado de “retrógrado”, e uma pessoa pede que alguém “deixe o lugar de Júnior Albuquerque para mim”.
Mensagens enviadas pelo Whatsapp a um dos jornalistas da Rádio Comunidade |
Antes da invasão, a equipe do programa “Olhando de Frente” havia proposto um debate ao vivo com apoiadores do presidente. “Eu disse que queria que esse pessoal fosse até a rádio para a gente debater e eles me explicarem o motivo de tanta raiva”, afirmou o radialista em entrevista à Rádio Jornal.
A Associação das Empresas de Rádio e Televisão de Pernambuco (Asserp) emitiu nota condenando o episódio e considerou o incidente como precedente perigoso que ameaça todos os veículos de comunicação.
A Abraji não conseguiu falar com o delegado responsável pelas investigações, Énio Maia. À Rádio Jornal, o delegado disse que o suspeito deverá assinar termo de compromisso para se apresentar no Judiciário.
É o segundo caso de ataque à sede de um veículo em menos de um mês. No dia 1.abr.2021, a Polícia Civil indiciou um bombeiro que ateou fogo contra o sobrado onde funciona o jornal Folha da Região, na cidade de Olímpia. Em depoimento à polícia, o militar disse que o ato foi uma revolta contra o posicionamento do jornal em defesa de medidas científicas e legais para enfrentar a pandemia de covid-19.
Pandemia em Pernambuco
Os comentários feitos pela equipe da rádio comunitária foram feitos durante o contexto do agravamento da pandemia em Pernambuco. Segundo o portal G1, o Estado totaliza até este sábado (10.abr.2021) 12.686 mortes desde o início da crise sanitária. O município de Santa Cruz do Capibaribe contabilizou 229 casos graves de pacientes com sintomas de síndrome respiratória aguda grave (SRAG), segundo dados da Secretaria de Saúde. No último boletim divulgado pelas redes sociais, a prefeitura de Santa Cruz registrou melhora nos dados de contaminação e internação e informou que 92 pessoas já morreram desde o ano passado.
As medidas de distanciamento social são defendidas pelos cientistas brasileiros e do exterior como uma das estratégias mais eficientes para conter o avanço da maior crise sanitária da história recente. O presidente Jair Bolsonaro diz que a solução acaba com a economia e destrói o comércio. Santa Cruz de Capibaribe, cidade na região agreste de Pernambuco a cerca de 190 km de Recife, é conhecida pela feira livre de roupas. Junto com as cidades de Caruaru e Toritama, atrai comerciantes de confecção do Nordeste.
“O índice de desemprego aqui na cidade beira a zero. Costumo dizer que a gente é o último a entrar em crise e o primeiro a sair quando tem uma crise nacional. É muito forte o ramo de confecções. Nós sabemos que o comércio sofre muito com um lockdown, mas, infelizmente, nós temos que salvar vidas. Porque sem vidas também não vai ter comércio”, pontuou o radialista.
* Colaborador da Abraji
**Foto: reprodução das redes sociais