• 21.12
  • 2015
  • 14:03
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Primeira turma da Pós-Graduação em Jornalismo Investigativo, parceria da Abraji com ESPM, se forma

A primeira turma da Pós-Graduação em Jornalismo Investigativo da ESPM-Rio, realizada em parceria com a Abraji, acaba de se formar. O curso, que teve início em abril de 2014, foi desenvolvido pelas duas entidades e ofereceu novos conhecimentos e ferramentas que auxiliam repórteres a fazer investigações jornalísticas.

Segundo Angelina Nunes, ex-presidente da Abraji e idealizadora da Pós ao lado de Marcelo Beraba, já existia uma vontade, por parte da associação, de se juntar com uma instituição de ensino de excelência para formatar o curso. “Havia uma demanda, sempre perguntavam em congressos se a Abraji oferecia algum curso nesse sentido”.

Leonardo Mancini, coordenador da Pós, disse que a ESPM também tinha vontade de criar uma atualização específica sobre a área, e que a associação era a mais representativa no campo. “A Abraji teve uma influência muito grande na hora de escolher assuntos e ferramentas do curso. O jornalismo investigativo é uma especialidade que precisa ser desenvolvida no Brasil e precisa de melhores repórteres, porque é uma atividade fundamental”, completa.

“Um programa como esse deve ser encarado como uma grande oportunidade de crescimento profissional tanto para quem vai fazer a Pós como para quem está participando como professor. É uma oportunidade grande, acaba sendo um fórum de troca de experiencias, de ferramentas, de troca de caminhos”, explicou Beraba, que também é ex-presidente da Abraji.

Para a aluna Gabriela Viana, o curso deu visões diferentes sobre a profissão, a ajudou no desenvolvimento do senso crítico, “deixou o olhar jornalístico mais apurado e nos ensinou formas diferentes e mais criativas de contar a notícia.” Fábio Teixeira, que também foi aluno do curso, acha que dominar técnicas como as ensinadas é fundamental para o bom jornalismo hoje: “o mundo está muito mais complexo e nunca foram tantas as técnicas de apuração disponíveis ao repórter. Sentar em uma sala de aula e ouvir de jornalistas mais experientes como utilizar estas técnicas deixou de ser um luxo e virou uma necessidade.”

“Podem ter certeza que com o curso nós descobrimos ferramentas e formas de trabalho em um curto espaço de tempo do que talvez levássemos para conseguir aprender durante a carreira. Desde a aplicação do Excel para desenvolver cálculos importantes para uma reportagem até buscar informações nos sites governamentais que, muitas vezes, são tão complicados para quem ainda não sabe mexer”, afirmou Clayton Pascarelli.

 

Experiências dos alunos

Como trabalho final, os alunos se dividiram em quatro grupos e fizeram uma grande reportagem investigativa. O grupo de Gabriela Viana abordou o tráfico internacional de pessoas entre o Brasil e a Bolívia. A reportagem mostrou como as redes sociais são usadas como um meio de aliciamento on-line, focando, especificamente, no tráfico para a exploração sexual.

“O processo de apuração e produção da reportagem durou quase dez meses. Como não tínhamos muitos dados oficiais, tivemos que buscar fontes que pudessem nos ajudar a chegar às informações necessárias para contar nossa história. Um dos pontos altos foi conseguir encontrar uma página no Facebook por onde jovens eram aliciadas e monitorar os perfis dos aliciadores. Criamos um perfil falso para isso. As propostas de viagens para trabalhar como dançarina e modelo na Bolívia eram frequentes e a nossa personagem fake foi aliciada. Além disso, encontrar uma vítima do crime (nossa personagem principal foi traficada para a Bolívia) foi fundamental para a construção e desenvolvimento da reportagem”, relatou.

A aluna disse que durante a pós aprendeu técnicas mais aprofundadas de investigação, sites e aplicativos que ajudam na apuração, além de aprender a trabalhar melhor com dados e novas plataformas. “Além disso, era incrível poder trocar ideias e experiências com profissionais renomados do jornalismo e colegas tão interessados em produzir reportagens que façam o leitor, ouvinte ou telespectador refletir sobre inúmeras questões.” 

Fábio Teixeira e seu grupo destrincharam gastos da Secretaria Estadual de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro de 2007 até 2014 e deram origem ao Projeto .50. Os alunos optaram por começar o trabalho com uma base de dados para, a partir daí, definirem pautas. “Mais importante do que o trabalho final, porém, foi a utilização de um método de apuração que, acredito, nenhum dos quatro repórteres tinha tentado antes”, afirmou.

Para Fábio, o mais importante para seu trabalho foram as técnicas de jornalismo de dados aprendidas durante o curso, através das aulas de José Roberto de Toledo, presidente da Abraji, e Tiago Mali, coordenador de cursos da associação. “Também tivemos aulas de Estatística, na qual aprendemos como analisar melhor os números e utilizar recursos de Excel que desconhecíamos. Outra aula de grande importância foi a de ´Análise e investigação de documentos públicos`, do Fábio Vasconcellos, que nos deu uma base necessária para saber o que era relevante ou não.”

Já o grupo de Clayton Pascarelli teve um diferencial que facilitou a execução do trabalho. O assunto abordado foi o sistema socioeducativo no Distrito Federal, Amazonas, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. “Isso foi possível com facilidade porque cada um dos colegas era de um lugar deste. Mariana Menezes de Brasília, Jacqueline Marum do Rio, Felipe Galdino do Rio Grande do Norte e eu do Amazonas”, explicou.

Angelina Nunes disse que, diferente de outros cursos, que costumam reunir alunos do eixo Rio - São Paulo - Brasília, os estudantes da Pós eram de regiões diferentes do Brasil, trazendo uma troca muito enriquecedora para sala de aula, tanto para alunos, como para professores. Foi o que aconteceu no grupo de Clayton.

“Durante o desenvolvimento do trabalho, cada colega buscou informações do seu estado e isso não foi uma tarefa tão fácil para todos. No caso do Rio e do Distrito Federal os dados eram mais explicativos quanto ao perfil socioeconômico e educacional dos adolescentes, mas no Amazonas e no Rio Grande do Norte essa realidade era outra. Após o levantamento de informações juntamos os dados e desenvolvemos o trabalho que as pessoas conseguem acompanhar no site”, relatou o aluno.

O grupo de Alana Saenen falou sobre saneamento básico no Município do Rio de Janeiro. A ideia inicial do grupo era relacionar o baixo investimento em saneamento básico com o alto custo de saúde pública. “Mas, no decorrer do trabalho, percebemos que na verdade existe alto investimento em saneamento, o problema é que ele ainda não chegou aos destinos finais em alguns bairros e comunidades do Rio”, explicou a aluna.

Para a reportagem, o grupo foi até duas comunidades que sofriam com problemas de saneamento: Rocinha, Zona Sul do município, e Terreirão, localizada na Zona Oeste. Nas redondezas de ambos os bairros estão localizados bairros nobres do Rio, com alto padrão de vida e moradia, o que fez o grupo concluir que o que deveria ser um direito a todos, acaba sendo privilégio de alguns.

Foi a primeira vez que o grupo mexeu com bases de dados, por isso, foi um grande desafio para todos. “Foi surpreendente ver que conseguíamos ver e pesquisar tabelas e fazer análise e o cruzamento de dados”, afirmou Alana. A jornalista disse ainda que o curso abriu portas, ampliou sua visão e trouxe à tona um segmento que ela ainda não conhecia dentro da sua profissão.

A Abraji e a ESPM trabalham em um novo currículo para uma especialização em jornalismo investigativo que deverá ser aberta a matrículas em 2016.

Assinatura Abraji