- 29.10
- 2021
- 11:25
- Alice de Souza e Eduardo Goulart de Andrade
Acesso à Informação
Pinpoint da Abraji recebe transcrições de lives de Bolsonaro e CVs de comissionados do governo federal
Curadora do projeto Pinpoint no Brasil, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) publica duas novas coleções com milhares de documentos e áudios de interesse público. No terceiro mês de parceria com o Google, a Abraji traz 99 transcrições de lives realizadas pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no YouTube, desde 2019, e 2.987 arquivos de currículos de comissionados com cargos ativos em todos os ministérios, com exceção da pasta do Trabalho, e em agências reguladoras do governo federal.
O Pinpoint é uma ferramenta do Google que utiliza o mesmo motor de inteligência artificial do buscador para identificar automaticamente nomes de pessoas, locais e empresas mencionados em documentos e áudios. A ferramenta é gratuita e pode ser acessada por quem tem conta no Gmail. Na plataforma, jornalistas podem encontrar com maior agilidade informações em uma grande quantidade de documentos. Além disso, o Pinpoint transcreve áudios automaticamente.
Até set.2021, a Abraji disponibilizou quatro coleções de documentos. Em ago.2021, foram os documentos da CPI da pandemia e do inquérito 4.828, que investigou as manifestações antidemocráticas. Essa coleção vem sendo atualizada. Em out.2021, foi incluído o relatório final da CPI da Covid. Em set.2021, foram liberados arquivos de prestação de contas e demonstrativos dos partidos em 2020 e relatórios de auditorias da Controladoria Geral da União (CGU) publicados desde jan.2018.
As lives transcritas de Bolsonaro e as palavras mais usadas
A coleção de transcrições das lives do presidente Jair Bolsonaro inclui a de 21.out.2021, na qual ele associa vacinas contra covid-19 à Aids. Essa fala motivou a retirada do vídeo do Instagram e do Facebook, além da suspensão do canal do presidente no YouTube por uma semana. Para chegar nesse trecho específico do documento no Pinpoint, basta fazer a seguinte busca na ferramenta: "21_10_2021" "imunodeficiência". Ou seja, informa-se o nome do arquivo e uma palavra-chave dita pelo presidente.
Na plataforma do Google também é possível pesquisar os documentos com os nomes de pessoas e organizações mais citados pelo chefe do Executivo nacional nas transmissões on-line. Entre os nomes mais falados, de acordo com o Pinpoint, estão Paulo Guedes (52 documentos), Lula (48) e Augusto Nunes (34). Com os filtros disponíveis na ferramenta, é possível ver menções a ex-integrantes do governo – como o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro (21) e o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo (5). E ainda é possível encontrar nomes de celebridades, como o jogador de futebol Neymar e a apresentadora Ana Hickmann – citados, respectivamente, quatro e três vezes.
Nas lives, as instituições mais citadas são o Senado, presente em 61 documentos, o STF (53), a Jovem Pan (51), o YouTube (47) e a Caixa Econômica (42). Para pesquisar citações ao Supremo Tribunal Federal, você pode digitar "Supremo Tribunal Federal" OR "STF" OR "Supremo". O operador OR (em caixa alta) permite pesquisar em documentos que contenham uma ou outra palavra-chave. Com a pesquisa "imprensa OR jornalismo OR jornalista OR jornal", chega-se a 75 documentos.
Importante frisar que as transcrições automáticas não são perfeitas. Elas contêm erros e variam de acordo com a qualidade do áudio e a dicção de quem fala. Por exemplo, no caso em que Bolsonaro associou vacinas à Aids, o Pinpoint trocou a palavra "vacinado" por "vazando". Além disso, eventualmente alguns trechos de áudio não são transcritos em sua totalidade. Por isso, o ideal é checar antes as transcrições, ouvindo cada trecho. Em breve, o Pinpoint irá permitir a edição de texto das transcrições direto na ferramenta.
O script em Python que capturou a lista de vídeos no canal do YouTube está aqui. E o código de programação que seleciona apenas os vídeos com o termo “live” no título, baixa o arquivo e faz a conversão para formato MP3 está aqui.
Checagem da experiência dos comissionados federais
A coleção com 2.987 currículos pode ser útil em diversos tipos de investigação. Talvez a primeira pergunta a se fazer é se um determinado comissionado tem experiência para ocupar aquele cargo. Saber onde um funcionário comissionado trabalhou também pode ajudar a desvendar possíveis conflitos de interesse a partir do cruzamento de informações presentes no currículo com agendas oficiais. Por exemplo, determinada autoridade está se encontrando com um antigo empregador? Outra possível apuração refere-se às já clássicas fraudes em currículos. Será que fulano e beltrano realmente estudaram em Yale ou Harvard? Por fim, o acesso facilitado aos CVs permite buscar por fontes em um determinado órgão.
Um decreto federal publicado no dia 5.out.2021 determina que órgãos federais devem divulgar em seus sites currículos de profissionais que ocupam cargos e funções comissionados de coordenação, coordenação-geral, diretoria, titular de departamento ou subsecretaria e titular máximo de secretarias, autarquias ou fundações. Essa nova norma ampliou a transparência, já que antes os órgãos deveriam publicar apenas os currículos de quem ocupava cargos de chefia ou direção. Normalmente, os documentos em formato PDF ficam localizados na aba de transparência dos órgãos – veja nas seções “composição” ou “quem é quem”.
Uma lei sancionada em set.2021 gera mudanças em cargos e funções do Executivo. Foram criadas duas categorias para as posições de confiança: o Cargo Comissionado Executivo (CCE) e a Função Comissionada Executiva (FCE). Elas substituíram os cargos de Direção e Assessoramento Superiores (DAS) e as funções e gratificações temporárias. Veja aqui os valores para remuneração de comissionados.
A Abraji baixou todos os documentos disponíveis nos sites dos ministérios e das agências reguladoras – com exceção do Ministério do Trabalho e Previdência, que ainda não disponibiliza esses dados em transparência ativa. Esses documentos foram solicitados via Lei de Acesso à Informação (LAI). Além disso, foram feitos outros pedidos via LAI – já que nem todos os órgãos apresentam todos os CVs na íntegra ou de todos os profissionais que precisam ter os currículos publicizados, conforme determina o decreto federal 10.829. Veja como pedir currículos por LAI neste tutorial da agência Fiquem Sabendo.
Outro ponto que vale ressaltar é que os currículos disponíveis nos sites dos órgãos não estão padronizados. Em alguns casos, as informações profissionais estão disponíveis somente na minibio do comissionado. Assim, faltam informações básicas como o período em que a pessoa ocupou determinado cargo, por exemplo. Boa parte dos órgãos respondeu via LAI que cumpre o que determina a legislação. No entanto, as solicitações da Abraji foram feitas antes da publicação do decreto que aumenta o escopo de transparência. Por isso, novos CVs devem ser acrescentados em breve. A coleção de currículos dos comissionados do governo federal considera apenas o quadro efetivo no presente e poderá ser atualizada no futuro, com o ingresso ou a saída de comissionados.
Nessa coleção, você pode pesquisar as instituições de ensino onde estudaram os comissionados, assim como o grau de escolaridade e especialização de cada um deles na área de atuação. Buscando pelo termo "Harvard", por exemplo, o Pinpoint retorna 53 documentos mencionando a prestigiada universidade dos Estados Unidos. Já a Fundação Getúlio Vargas aparece em 491 documentos. Para chegar nesse resultado, é preciso fazer a seguinte busca: "Fundação Getúlio Vargas" OR "FGV". E quando busca-se por "doutorado", vemos que há 242 menções ao termo.
Ambas as coleções poderão ser atualizadas nos próximos meses. No fim de nov.2021, mais duas novas coleções estarão no Pinpoint. Para acompanhar as novidades, assine esta newsletter e fique ligado nas redes sociais da Abraji.
Foto de capa: Captura de tela da transmissão ao vivo, do dia 21.out.2021, em que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) compartilhou um conteúdo sobre uma suposta relação entre as vacinas contra a covid-19 e a Aids. Essa suposta relação não tem comprovação científica./ Reprodução do Facebook
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