- 08.12
- 2006
- 14:29
- Belisa Figueiró
Paglia conta como curso ajudou na África
O aprendizado de técnicas de segurança levou o experiente repórter da Rede Globo, Ernesto Paglia, a tomar cuidados não muito comuns no trabalho da imprensa em situações de conflito e violência. Ele cobriu a viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Cúpula África-América do Sul, no final de novembro, na Nigéria, onde os jornalistas eram advertidos pelos diplomatas de que poderiam estar sujeitos a situações de risco. Paglia diz que encontrou uma cultura especializada em tirar proveito dos estrangeiros, mas que as técnicas ensinadas no curso, realizado pelo International News Safety Institute (INSI) em parceria com a Abraji, o ajudaram a ficar um pouco mais preparado para estas situações.
O treinamento aconteceu entre os dias 6 e 17 de novembro, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Durante o curso, 107 profissionais da mídia receberam dicas de segurança pessoal, implantação e planejamento de contingência, gerenciamento de conflito, primeiros-socorros, armas menores, roupas à prova de bala, seqüestro e estresse pós-traumas. O programa se propôs a atender às necessidades de segurança na cobertura de matérias investigativas ligadas à violência nos grandes centros urbanos.
Confira a entrevista com o jornalista Ernesto Paglia:
Como foi a chegada a Abuja?
Fomos recebidos pela embaixada brasileira. O diplomata logo disse para ter cuidado com a bagagem, não usar cartão de crédito nem para pagar o hotel. Também orientou que não deveríamos sair sozinhos e, se saíssemos, era conveniente dizer para onde e a que horas voltaríamos. O clima era de ameaça no ar e ficamos num ambiente restrito. Na sexta-feira, depois do evento, tínhamos um dia de folga, justamente aquele que é considerado o dia sagrado para os muçulmanos. Decidimos dar uma volta pela cidade para conhecer os pontos turísticos. Pegamos um taxista conhecido do hotel.
Que tipo de ameaça era essa?
Nos disseram que o ambiente era potencialmente hostil, principalmente nas questões financeiras. Há um caldo de cultura de tirar proveito do estrangeiro. Um homem chegou a se aproximar com uma conversa muito estranha. Disse que o pai tinha morrido e que ele tinha herdado uma empresa milionária e estava procurando um sócio. Nós, brasileiros, não caímos muito nessas histórias. Mas os turistas europeus, por exemplo, podem correr esse risco.
E como foi esse passeio pela cidade na sexta-feira?
Visitamos uma mesquita e assim que desci do carro, lembrei de várias dicas do curso. Alguns colegas queriam sair, dispersar para procurar pautas, o que é típico da imprensa nesses casos, porque todos têm a obrigação de conseguir um material diferente, uma foto exclusiva. Mas alertei para pensarmos numa rota de fuga caso houvesse algum conflito no local. A mesquita fica próxima de uma igreja cristã, então deveríamos estar preparados. Deixamos o carro perto e pegamos o taxista também para ser o nosso guia. Ou seja, montamos um plano B, o que raramente fazemos no dia-a-dia das reportagens.
Vocês conseguiram entrar na mesquita, entrevistaram algum muçulmano?
Tentamos entrar, mas não conseguimos. Disseram para a equipe não tirar fotos, porque as pessoas poderiam se sentir ofendidas. Os colegas acabaram fazendo imagens discretamente.
E quais foram as maiores dificuldades?
Jornalista pensa que é invulnerável, que está acima de qualquer suspeita. E nós ali éramos rapidamente identificados como estrangeiros, principalmente por causa da cor da pele. Felizmente não houve nenhum conflito maior, mas tivemos todo o cuidado possível.