- 08.03
- 2020
- 09:00
- Abraji
Liberdade de expressão
Mulheres jornalistas sob ataque
No rol de estratégias utilizadas para minar instituições democráticas, atacar a imprensa livre é uma velha conhecida. Uma face perversa dessa prática vem se manifestando de forma mais recorrente no Brasil, com apoio e participação direta do presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos: ofensas de cunho machista e misógino, com o claro intuito de ferir a credibilidade e intimidar jornalistas mulheres.
Os alvos prioritários são profissionais que se destacaram por investigar e revelar aspectos nebulosos sobre a vida política da família Bolsonaro. É o caso de Constança Rezende, Miriam Leitão, Juliana Dal Piva, Marina Dias, Patrícia Campos Mello e Vera Magalhães. São comuns xingamentos de "vadia", "prostituta" e insinuações de que mulheres jornalistas venderiam seu corpo por notícia.
Os ataques mais abjetos foram dirigidos contra Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, em fevereiro. Uma enxurrada de imagens e termos de baixo calão se espalhou pelas redes sociais depois que o deputado federal Eduardo Bolsonaro propagou a versão de uma testemunha da CPMI das Fake News, de que a jornalista teria oferecido sexo em troca de informações. As grosserias foram repetidas pelo presidente, mesmo depois de a jornalista apresentar provas de que a testemunha mentira. Na verdade, as mensagens trocadas com a fonte revelam o contrário: a repórter é quem foi assediada.
Análise das postagens no Twitter durante esse episódio evidencia o foco dos ataques em jornalistas mulheres: os perfis que mais receberam respostas foram os de Patrícia Campos Mello, Vera Magalhães, Miriam Leitão, Andréia Sadi e Mônica Waldvogel.
Casos assim se acumulam desde o início do governo Bolsonaro. Em março de 2019, o presidente e seus apoiadores difundiram nas redes sociais declarações distorcidas da repórter Constança Rezende, que na época trabalhava em O Estado de S.Paulo. Informações falsas também foram utilizadas para desabonar Miriam Leitão. Jair Bolsonaro mentiu ao afirmar que a jornalista e colunista de O Globo integrara a luta armada contra a ditadura militar e que nunca havia sofrido tortura.
Pesquisa lançada em 2018 pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em parceria com a Gênero e Número, revelou que 84% das jornalistas já sofreram alguma situação de violência psicológica no trabalho, incluindo insultos presenciais ou pela internet, humilhação em público, abuso de poder ou autoridade, intimidação verbal, escrita ou física e ameaças pela internet. Além disso, 70% delas já se sentiram desconfortáveis após abordagens de homens no trabalho.
Esse ambiente hostil se exacerba quando o ocupante da Presidência da República se soma aos que atacam as jornalistas. Não são apenas elas que perdem. Ecoar o machismo e a misoginia aumenta o risco para todas as mulheres brasileiras. Desgastar a liberdade de imprensa desfia o nosso já puído tecido democrático. Aqueles que têm apreço pela democracia precisam defender as vozes das mulheres jornalistas e se opor às tentativas de intimidá-las. Caladas, jamais serão.
Amanda Rossi, Cristina Zahar, Katia Brembatti, Maiá Menezes, Natália Mazotte, Thays Lavor
Diretoras da Abraji