Mário Frias assume terceira colocação em bloqueios de jornalistas no Twitter
  • 13.07
  • 2021
  • 18:11
  • Pedro Teixeira

Liberdade de expressão

Acesso à Informação

Mário Frias assume terceira colocação em bloqueios de jornalistas no Twitter

Muito ativo no Twitter, o secretário especial da Cultura do governo Bolsonaro, Mário Frias, fez cerca de 3.300 publicações até hoje e é seguido por quase 240 mil perfis. De acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Frias se tornou a terceira autoridade que mais bloqueou jornalistas no Twitter: vetou 19 profissionais de imprensa na sua conta pessoal nesta rede social.

Frias ultrapassou, na manhã desta terça-feira (13.jul.2021), Arthur Weintraub (17), ex-assessor da Presidência da República, ficando atrás apenas do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub (30), e do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) (69). A Abraji monitora bloqueios na rede social desde set.2020, com financiamento da Open Society Foundations.

No sábado (10.set.2021), Frias bloqueou o jornalista esportivo André Henning, depois de virar alvo de piadas por ter errado o nome do técnico da seleção brasileira, Tite. Após o Brasil perder a final da Copa América para a Argentina, Frias clamou em tweet “#foratiti”.

Após o “#foratiti” atingir os trending topics da rede social de microblogs, ele resolveu apagar a publicação, mas continuou vetando jornalistas. O repórter Renato Onofre, da TV Globo, afirmou que nunca sequer interagiu com o secretário especial da Cultura até perceber o bloqueio do ator nesta terça-feira. A situação se repetiu com outros jornalistas que responderam ao formulário de bloqueios da Abraji.

Fora os jornalistas, Frias baniu o caderno de cultura da Folha de S.Paulo, que há mais de seis décadas cobre o setor. Entraram na lista de impedidos a Ilustrada e outros jornalistas que cobrem o mandato do ex-ator de Malhação depois da publicação de uma série de reportagens sobre o desmonte de uma comissão da sociedade civil que analisava projetos no âmbito da Lei Rouanet.

Segundo o monitoramento da Abraji, somadas todas as autoridades que impõem restrições a jornalistas nas redes sociais, já são 252 bloqueios a 126 jornalistas e 11 a nove veículos. Ainda de acordo com a Abraji, até 2018 apenas 25 jornalistas tinham sido banidos por autoridades em posse de cargo público.

Frias ameaça processar jornalistas

Ainda no Twitter, os jornalistas Fabiana Moraes e Bob Fernandes criticaram a postura do secretário especial da Cultura do governo Bolsonaro, Mário Frias, diante da reprovação do apoio ao Festival de Jazz do Capão na Bahia e sofreram na noite de segunda-feira (12.jul.2021) ameaças judiciais como represália.

Os dois opinaram de forma contrária sobre um parecer técnico da Fundação Nacional das Artes (Funarte) que barrou, com justificativas de cunho religioso, o acesso a recursos públicos ao evento, que se declarou “antifascista e pela democracia". A Funarte está sob responsabilidade da pasta de Frias.

A colunista do The Intercept Brasil e professora de jornalismo da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE), Fabiana Moraes, publicou sequência de tweets sobre o documento na manhã de 12.jul.2021.

O motivo para a decisão desfavorável segundo o documento foi uma postagem no Instagram do festival, ano passado, contra o fascismo. O parecer cita também "a música pode ser vista como arte divina", apontou Moraes na publicação.

Moraes se tornou alvo de Frias quando comentou horas depois tweet do ex-ator de Malhação em defesa da medida. “Um pouco de poder a um otário e”, ironizou a jornalista. A que o secretário especial respondeu às 18h53: “nos veremos na Justiça, com um processo de injúria”.

À Abraji, Fabiana Moraes disse que nunca havia interagido antes com o chefe da pasta da Cultura. Segundo ela, a escolha do termo otário visou o sentido de ingenuidade, inexperiência. “Cabe bem para o que pensa um secretário de Cultura que não entende qual é o seu papel enquanto agente público e trata a pasta como extensão das pessoas que trabalham com ele, de igrejas neopentecostais”.

Ainda de acordo com Moraes, o caso reforça a importância da liberdade de crítica da imprensa e dos jornalistas ante tentativas de intimidação. “A história começou com um tweet, que fiz na minha conta pessoal apontando aquela ingerência. E foi algo que repercutiu em outros espaços depois”, avaliou.

Já às 22h22 da segunda-feira, foi a vez do jornalista Bob Fernandes ser ameaçado pelo ex-ator de Malhação com um processo de calúnia. Fernandes afirmou que, nos embates sobre a recusa de apoio via Lei Rouanet ao Festival de Jazz do Capão, Frias agiu como um fascista.

Procurado pela Abraji, o advogado criminalista e ex-comentarista da CNN Brasil Marcelo Feller considera que o caso de Fernandes não pode ser considerado calúnia nem o de Fabiana Moraes injúria. O ato calunioso consiste na imputação de um crime e, segundo Feller, fascista é adjetivo e não ação criminosa.

No caso da jornalista pernambucana, o advogado considera muito difícil provar a intenção de ferir a honra com o uso do qualificativo “otário”. “Um juiz criminalista dificilmente aceitaria essa causa”, comenta.

Um comentário de Feller alcançou os trending topics do Twitter na manhã desta terça-feira. “Pessoal, está proibido chamar o @mfriasoficial de otário, tá?”, escreveu. A hashtag “#mariofriaséotário” conta, até agora, com mais de 16 mil publicações.

De acordo com o advogado, a campanha espontânea desencadeada após o ataque a Fabiana Moraes pode ser usada em uma possível defesa. “Crimes contra a honra são ações penais privadas, que têm uma regra chamada indivisibilidade. Supondo que duas pessoas cometeram um crime contra mim. Caso eu escolha buscar a Justiça apenas contra uma delas, a lei entende que, se eu perdoar uma delas, ainda que não seja de modo tácito, o perdão é válido para qualquer um. A situação da campanha não é exatamente esta, mas o argumento é bastante defensável”, explica.

O influenciador Felipe Neto seguiu a onda de críticas ao secretário especial da Cultura. “O Mario Frias está processando criminalmente quem o chama de otário? Mario Frias, eu não te acho otário não. Eu te acho um admirador lambe-botas de genocida e conivente com o genocídio praticado pelo seu mestre. Você, aos meus olhos, é uma vergonha para a cultura brasileira", publicou.

Antes de indicar que irá buscar a Justiça contra o youtuber, Frias escreveu: “eu ia te tratar como um fedelho deslumbrado com meia dúzia de slogans bobos, mas aí eu descobri que, apesar do comportamento infantil, o homem-foca é um marmanjo de mais de 30 anos”.

O ex-ator de Malhação passou a noite de segunda-feira comentando publicações contra e a favor do barramento de recursos para o evento de música. Ele acusou, inclusive, o Jornal Nacional, da Globo, que repercutiu o assunto, de “criar um factóide em cima de uma decisão técnica” e elogiou a opinião de políticos da base de apoio do governo Bolsonaro sobre o caso.

Caso Marcelo Adnet

O secretário especial da Cultura é alvo de uma ação criminal por injúria e difamação. O bolsonarista fez em 04.set.2020 um longo texto contra o comediante Marcelo Adnet.

O ex-ator de Malhação referiu-se ao humorista como “garoto frouxo e sem futuro”, uma “criatura imunda”, “crápula” e “Judas”. "Quem em sã consciência consegue conviver no mundo real com um idiota egoísta e fraco como esse? Onde eu cresci ele não durava um minuto. Bobão!", concluiu em tweet.

Adnet buscou, no dia 03.mar.2021, a Justiça com ação distribuída para a 42ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ). A defesa de Adnet alega que a publicação é "ofensiva a sua honra" e se trata de uma "reação descabida, que ultrapassa os limites da liberdade de expressão".

Segundo a coluna de Ancelmo Gois no jornal O Globo, a Justiça do Rio não consegue intimar Frias. “Em certidão apresentada na semana passada, o oficial de Justiça responsável por notificar o secretário informou que ele "parou de receber suas mensagens" no WhatsApp”, contou o colunista.

Para a professora de jornalismo Fabiana Moraes, o caso de Adnet deixa claro como Mário Frias e outros membros do governo Bolsonaro tomam a liberdade de expressão como um direito somente para si. “Quando tinha um Ministro da Educação como [Abraham] Weintraub, que afirmava ‘meu Twitter, minhas regras’, isso era aplaudido por esses homens. Mas, quando alguém faz um comentário como o meu vem essa medida?”, questiona.

Assinatura Abraji