- 11.01
- 2023
- 17:55
- Abraji
Liberdade de expressão
Mais de 40 jornalistas foram atacados desde domingo
Foto de capa: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A cobertura da invasão às sedes dos Três Poderes, em Brasília, no domingo (8.jan.2023), e da retirada dos acampamentos bolsonaristas em frente a quartéis nos estados, nos dias subsequentes, resultou na agressão a dezenas de jornalistas. Um levantamento feito pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) revela que, na capital, durante os atos, houve 16 casos de agressão. Em alguns episódios, os jornalistas chegaram a ser roubados. Outros dois ataques ocorreram fora do Distrito Federal, em acampamentos bolsonaristas. As duas organizações identificaram, no total, 37 ocorrências e mais de 40 profissionais atacados no exercício da profissão (em algumas situações, mais de uma pessoa foi agredida no mesmo momento).
Outro episódio somou-se a esses casos: a ofensa do procurador-geral da República, Augusto Aras, à colunista de O Globo Miriam Leitão. Ela havia escrito um artigo apontando a omissão da PGR que colaborou para o recrudescimento da violência desses grupos bolsonaristas que, desde 30.out.2022, negam-se a aceitar o resultado das urnas. Em entrevista a um meio de imprensa, Aras fez afirmações misóginas e levantou, sem provas, dúvidas éticas sobre a jornalista, uma das mais conceituadas do país.
O ataque foi repudiado pela Abraji em ofício enviado hoje (11.jan.2023) ao Corregedor Nacional do Ministério Público, destacando que, em um contexto riscos para o exercício do jornalismo no país, a fala representa um ato simbólico de endosso à onda de violência contra jornalistas, vindo de uma instituição que deveria, ao contrário, estar zelando por uma imprensa livre e pela defesa das instituições democráticas.
O cenário de violência física e verbal foi aterrador nesta semana. Truculenta, a multidão que depredou os prédios governamentais também esmurrou, chutou, estapeou, expulsou, ofendeu e encurralou equipes de reportagem que trabalhavam no local. Equipamentos e bens pessoais foram destruídos e roubados. Ao mesmo tempo em que esse quadro é tristemente familiar, pois vem ocorrendo desde a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro nas urnas, tornou-se assustadoramente mais grave no início deste ano, com tentativas de linchamento e ameaças com armas de fogo.
Um repórter do jornal O Tempo, de Minas Gerais, que registrava os atos terroristas no Congresso Nacional foi agredido e mantido em cárcere privado por cerca de 30 minutos. O jornalista recebeu diversos socos, chutes e tapas, teve seu dinheiro roubado e foi acusado de ser um “infiltrado petista” enquanto ouvia, sob a mira de uma arma, que iria morrer. A Polícia Militar posicionada nos arredores do Palácio Itamaraty não prestou auxílio ao profissional.
Em um episódio igualmente chocante, uma repórter fotográfica do Metrópoles foi agredida por dez homens no entorno do Congresso Nacional. Ela fotografava o evento quando foi cercada por extremistas, tornando-se alvo de gritos, chutes e socos na barriga. Seu equipamento e seu celular foram roubados. Uma correspondente do The Washington Post também foi encurralada e atacada. Quebraram seus óculos, puxaram seus cabelos e a chamaram de “vagabunda” e “vadia” diversas vezes.
Entre a longa lista de vítimas, também estão repórteres e fotojornalistas dos meios Folha de S.Paulo, O Globo, Band TV, RecordTV, Rede Massa, Banda B, Hora Campinas, CBN Maceió, Portal Cada Minuto, Poder360, Congresso em Foco, Ponte Jornalismo, Brasil 247, Rádio Jovem Pan e das agências Brasil, Anadolu, France Press (AFP) e Reuters. A maior parte (43,2%) dos ataques se concentrou em Brasília. A Abraji identificou outros casos em São Paulo, Rio de Janeiro, Praia Grande e Ribeirão Preto (SP), Curitiba, Florianópolis, Recife, Natal, Maceió, Cuiabá, Lucas do Rio Verde (MT), Campo Grande e Rio Branco.
A ponta de um (assombroso) iceberg
Os 37 ataques registrados entre os dias 8 e 9.jan.2023 são recortes de um contexto amplo de agressões à imprensa. Desde o fim do período eleitoral, foram identificados 115 casos de violência política contra jornalistas, todos considerados graves – envolvendo agressões físicas, destruição e roubo de equipamentos, intimidação e ameaças. Apoiadores de Jair Bolsonaro despontam como os agressores na esmagadora maioria dos casos.
Atos antidemocráticos, realizados desde 30.out.2022, em recusa à vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), definiram 2022 como o ano mais violento para profissionais da imprensa desde 2019, início do monitoramento sistemático de ataques a jornalistas feito anualmente pela Abraji. Houve um crescimento de 22,7% nos casos em relação a 2021. Em 2023, os recordes continuam sendo batidos: com o cenário político turbulento, foi registrado quase o triplo de agressões em relação ao mesmo período no ano passado.
Organizações como o Pacto pela Democracia, Voces del Sur (VdS), IFEX, Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Repórteres sem Fronteiras (RSF), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Transparência Internacional - Brasil, Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), CBN Maceió e Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), além da Abraji, estão entre as que se manifestaram em repúdio aos ataques em Brasília e no resto do país.