- 13.05
- 2009
- 11:17
- -
Jornalistas do Brasil e França compartilham seus olhares sobre China e Oriente Médio em São Paulo
No último 11 de maio, véspera da entrega do Prêmio Albert Londres de jornalismo, jornalistas brasileiros e franceses discutiram China e Oriente Médio na Aliança Francesa de São Paulo. O debate foi marcado por uma falta de perspectivas com relação à solução para o conflito Israel-Palestina e pelo posicionamento internacional da China no que toca a economia e os Direitos Humanos.
Josete Alias, presidente do Prêmio Albert Londres e correspondente do Le Monde em Tunis, fez uma análise pouco otimista do conflito palestino-israelense: “Em Israel, hoje não se aceita de jeito nenhum o Estado Palestino, e o Hamas não quer reconhecer o Estado de Israel. Houve um retrocesso. Voltamos a um ponto anterior à assinatura de tratados de paz”.
A jornalista observou que o conflito vem mesmo se estendendo, do norte da África ao Irã, e tem aumentado a diáspora dos palestinos. “Houve a guerra de 1948, da Independência, do Canal de Suez, do Yom Kippur, recentemente, a de Gaza e qual foi o resultado? Nenhum. Esses conflitos resolveram apenas questões periféricas, como a do Egito e da Síria, que criou um Status Quo. Eu não vejo saída”.
Cláudia Antunes, editora de Mundo da Folha de S. Paulo, complementou a análise de Alia com uma observação do posicionamento europeu com relação ao conflito: a relação econômica entre Israel e a Europa é muito maior que aquela entre Israel e os EUA. “Há, logo, um déficit diplomático da Europa na região, uma omissão muito grande”. A Europa, também por já ter sido potência dominante no Oriente Médio, deveria posicionar-se com relação a esse conglito. “Mas, como em quase todos os assuntos, o continente não consegue ter uma opinião unificada”, observa a jornalista.
Benjamin Barthe, vencedor do prêmio em 2008 por uma série de artigos sobre a Faixa de Gaza, focou sua análise naquela região. Na percepção do jornalista francês, o bloqueio à Faixa de Gaza é uma grande arma política de Israel. Ele citou o pitoresco caso do tomate-cereja, produto agrícola típico de Gaza, que não consegue ser exportado por conta do bloqueio. Também, o dinheiro vindo da Europa, por vários meses, não pode entrar. “A guerra de Gaza foi uma conseqüência desse bloqueio”, avalia.
Lourival Sant´Anna, ex-correspondente do Estado de S. Paulo na Palestina e atualmente repórter- especial do jornal, destacou a delicada posição em que costumam se encontrar jornalistas que cobrem Oriente Médio. “Recebemos cartas de judeus e também de árabes, reclamando de parcialidade para um dos lados".
Diante “do labirinto interminável” que é cobrir o conflito e todas as negociações em torno dele, o que os jornalistas têm buscado são histórias. Sant’Anna contou de um palestino de 17 anos que sonhava estudar desenho industrial, mas não tinha a menor perspectiva de chegar à universidade. O garoto também gostava de jogar basquete, mas teve a quadra onde treinava destruída por israelenses. Seu melhor amigo era um policial de 21 anos que morreu baleado. “Eu e meus amigos não temos nada para fazer aqui”, foi o que Sant’Anna ouviu do garoto.
Segundo o jornalista, não é preciso procurar muito por depoimentos como esse. “Todo palestino tem uma história para contar. Essas histórias mostram simplesmente que as marcas desse conflito são impossíveis de se superar. As camadas de ressentimento, ódio, culpa vão se sobrepondo de uma forma que não vejo uma possibilidade política de sanar isso. Não é só a questão da terra, mas de um simbolismo histórico e para entender o que se passa só mesmo ouvindo essas histórias”.
China
O editor de assuntos internacionais do Estado de São Paulo, José Barella, discutiu a inserção da China no recente cenário internacional com Philippe Rochot, ex-correpondente em Pequim do canal France 2. Ambos atentaram para a questão de os próprios chineses não se mostrarem muito preocupados com a falta de liberdade política na China.
”Em todo momento se percebe que aquele país é uma ditadura. A gente fica aqui discutindo democracia, Direitos Humanos na China, mas há uma minoria de intelectuais chineses que ligam para essas questões; os próprios chineses estão apoiando o governo”, comentou Barella logo no início.
O jornalista do Estadão lembrou que, há uma semana, a China se tornou o primeiro parceiro comercial do Brasil, ultrapassando os Estados Unidos, mas que nossa relação com os chineses quase se resume ao plano econômico. "A representação diplomática do Brasil na China é menor que em Portugal”, observou.
Rochot relembrou o passado recente das relações França-China, que de início pareciam bem estreitas, até os contínuos atos de repressão do governo de Pequim. A França foi o primeiro país europeu a reatar relações diplomáticas com a China comunista, dois anos antes da Revolução Cultural. Mas após a repressão aos estudantes, a França impôs um embargo a vendas de arma à China e deu asilo aos jovens revoltosos que foram condenados à morte. “Os franceses são muito sensíveis com relação aos Direitos Humanos”, disse Rochot ao mencionar outro motivo de desconforto diplomático entre os dois países: o Tibet.
Para Barella, diante da avassaladora expansão da economia chinesa e seu forte impacto no mundo globalizado, “temos que nos perguntar que tipo de mundo queremos. O modelo chinês, com mão-de-obra baratíssima? O que mais cresce na China, além do padrão de vida do chinês, é a desigualdade social. Na China não há ensino nem saúde gratuita, não existe previdência social. Nós temos uma tradição democrática e, para nós, isso é impensável”.