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Jornalistas debatem o erro e como evitá-lo em reportagens

Publicado em 25 de julho de 2014 em Zero Hora

O recente e rumoroso erro do jornalista Mario Sergio Conti — que publicou uma entrevista com um sósia de Luiz Felipe Scolari pensando que fosse o próprio treinador da Seleção Brasileira — motivou um intenso debate no 9º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, que começou na quinta-feira e termina no sábado, em São Paulo.

— O erro é um monstro com o qual se flerta todo dia. Ou toda hora, nesses tempos de internet e manchetes substituídas a cada duas horas — desabafa Clóvis Rossi, repórter especial da Folha de São Paulo, um dos apresentadores do painel "Ooops! O que grandes jornalistas aprenderam com seus grandes erros". 

O debate contou também com a presença de Suzana Singer (ex-ombudsman do jornal Folha de São Paulo), Heródoto Barbeiro (Rede Record) e João Paulo Charleaux (ONG Conectas).

Rossi lembrou episódios de erros nos quais foi envolvido, felizmente mais hilários do que daninhos. Em 1989, recebeu de um colega a informação de que o governo Sarney planejava congelamentos de preços "em cascata". Mesmo sem saber direito o que seria isso, falou com um ministro, que tinha ouvido o rumor. O jornal publicou, mas essa medida econômica nunca aconteceu, nem foi cogitada. 

Outra "barriga" (erro ou exagero, em jargão jornalístico) admitida por Rossi foi de que o general Augusto Pinochet, ditador do Chile, estava "cai ou não cai" em 1979, durante uma crise política. Rossi torcia fervorosamente pela queda do militar chileno e cravou em manchete de revista que ele estava por cair.

— Caiu, 10 anos depois. Confundi desejo com realidade — resume Rossi, um dos mais respeitados jornalistas do país.

Heródoto Barbeiro contou que, anos atrás, foi procurado na rádio CBN por um sujeito que se dizia empresário. Como comandava um programa que divulgava bons e bem sucedidos empreendimentos, o radialista topou fazer uma entrevista com o homem, a quem não conhecia. Acontece que ele estava diante de um ator, obstinado em provar que a mídia é irresponsável. O homem gravou a sua performance como "empresário", embora fosse tudo fingimento, e divulgou para o mundo o erro de Heródoto. Um equívoco ao qual o jornalista foi induzido, mas no qual pecou pela falta de checagem da informação.

— É para evitar essas situações que a rádio BBC, de Londres, só dá notícia checada com três fontes diferentes. Algo que seria saudável, mas poucos de nós fazem — ensina Heródoto.

Outro erro ao qual os jornalistas foram induzidos foi o da Escola Base, talvez uma das maiores injustiças já cometidas no Brasil. Suzana Singer era editora responsável pelo setor que publicou uma reportagem na Folha de São Paulo que falava em professores de uma escola infantil que teriam abusado de alunos. A informação fora passada por um delegado de Polícia (que indiciou os suspeitos pelo crime) e por pais de estudantes, que davam detalhes do suposto crime. 

Posteriormente, os suspeitos foram inocentados, mas quase foram linchados antes disso, relata Suzana.

— Difícil escapar de uma armadilha assim, já que o delegado é uma autoridade supostamente embasada para provar o que disse (e não estava). E os pais eram testemunhas que deveriam ser confiáveis (e não eram). É o típico erro em que confiamos demais nas fontes — desabafa Suzana.

A ex-ombudsman da Folha disse que o erro é inerente à atividade jornalística. Tudo conspira para que ele ocorra: a pressão do tempo, o interesse nem sempre claro das fontes, urgências nem sempre verdadeiras. E quais as saídas para esse dilema? Suzana, Heródoto e Rossi recitam algumas dicas para jornalistas e seus chefes:

 — Não deduza, pergunte.

— Cheque com várias fontes a informação.

— Na pressa, evite matar alguém antes de confirmar a morte.

— Evite jornalismo declaratório. A pessoa pode estar convicta, mas enganada. Ou, pior, mentindo com a intenção de prejudicar ou aparecer na mídia.

— Melhor credibilidade do que instantaneidade.

Assinatura Abraji