- 18.06
- 2018
- 14:51
- Rafael Oliveira
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Intersecções de jornalismo e documentário são tema do 13º Congresso
O jornalismo e o documentário carregam semelhanças, mas também muitas diferenças. Para debater onde as duas formas de contar histórias se aproximam e onde se distanciam, a programação do 13º Congresso da Abraji traz o painel Jornalismo e documentário: intersecções. Entre 9h e 10h30 de sábado (30.jun.2018), Fabíola Aquino, Daniel Brunet e Vinícius Sassine debaterão o assunto a partir de experiências práticas.
Para Aquino, as intersecções das duas áreas existem e são “muito ricas”. “O jornalista conhece a realidade social melhor do que ninguém, está vivendo as mudanças, os conflitos, no dia a dia. É como dizem: ‘quando a realidade parece ficção, é hora de fazer documentário’”, diz. Ela é produtora executiva do documentário Sem Descanso, do diretor francês Bernard Attal.
A película, que deve ser lançada no segundo semestre de 2018, tem como gancho uma série de reportagens publicadas pelo Correio (BA), em 2014. A história, descoberta pelo repórter Bruno Wendel, revelou que o jovem Geovane de Santana havia desaparecido após abordagem de policiais militares. Após investigações, constatou-se que ele fora assassinado pelos PMs.
O projeto se centra em três diferentes camadas: a investigação do crime, conduzida pelo pai de Geovane e pelo jornal; a comparação com o caso Michael Brown, ocorrido nos EUA na mesma semana; e o debate sobre as raízes históricas e sociais da violência policial.
O diretor de Plantão Judiciário, Daniel Brunet, tem a mesma opinião de Aquino : “Jornalismo e documentário, geralmente, têm o mesmo campo de interesse. Um assunto que desperta curiosidade no repórter também mexe com o documentarista. Os dois são profissionais que contam histórias, embora usem linguagens diferentes”, explica Brunet, que também é repórter de O Globo.
O documentário nasceu da experiência de oito anos de Brunet na cobertura da área de saúde. Os plantões judiciários são serviços oferecidos por Tribunais de Justiça para garantir a apreciação de causas urgentes.
Lançado em dezembro de 2017, o filme já passou por festivais de cinema e tem sido exibido em favelas, associações e centros culturais de classes, além de faculdades. “Nessas sessões, eu debato a judicialização da saúde com quem faz parte dela: advogados de planos de saúde, defensores públicos, juízes, corretores de planos de saúde e com a população em geral. A ideia é usar o filme para debater o sistema de saúde”, aponta.
Para Vinicius Sassine, que dirigiu o documentário Escape, o jornalista “domina técnicas de produção bastante úteis ao cinema do real”, mas no documentário a emoção importa mais do que a informação. “Os elementos estéticos, artísticos e narrativos do cinema são um enorme desafio para um jornalista. São incontáveis as diferenças. Tudo muda: a natureza do trabalho, a relação com os personagens, os silêncios, a maneira como se tratam as descobertas”, aponta.
Inspirado por reportagens sobre a migração de brasileiros para a Europa, feitas por ele no início da carreira, o filme conta a história de uma travesti brasileira em Barcelona. “Sempre havia uma quantidade expressiva de travestis nesses fluxos migratórios, e eu sempre havia escrito essas reportagens da perspectiva da saída, nunca da chegada. Quando fui a Barcelona fazer a pós-graduação em documentário criativo, decidi fazer um documentário relacionado ao assunto”.
Na película, a travesti Lludy acaba de perder seu apartamento na cidade catalã. Por seis meses, o documentário a acompanha, sem uma ordem cronológica, nem entrevistas, mas com uma ordem narrativa. “De dentro de um depósito onde guarda sua infinidade de coisas, ela revisita sua condição migrante e sua solidão, sua fuga de todas as condições que lhe foram impostas em décadas de prostituição, discriminação e marginalização”, explica Sassine.
Segundo Brunet, a principal diferença entre realizar uma reportagem e um documentário foi poder se desprender da obrigação de explicar o máximo possível. “O jornalismo te obriga, por exemplo, a dar espaço ao contraditório, ao outro lado. O documentário não. Aliás, o documentário sequer te obriga a contar a história inteira. Há filmes que se limitam a um pedacinho de uma história e, mesmo assim, são extraordinários”, diz.
O curta-metragem de Brunet une interação e observação. “Decidi contar essa história usando um dispositivo, conceito criado pelo Eduardo Coutinho que consiste em dar limite para as filmagens. Coutinho fez um filme todo dentro de um prédio, o ‘Edifício Master’. E eu fiz um filme todo dentro de uma repartição do Judiciário, embora o doc seja sobre o sistema de saúde”, explica o repórter.
Para Aquino, os documentaristas têm um “luxo” que os repórteres, pela demanda de pautas, não tem. “Os jornalistas são uma fonte incrível de histórias, que os documentaristas vão poder desenvolver e analisar com todo o tempo que o jornalista não tem. Demorou três anos para fazermos esse filme”, explica a produtora executiva de Sem Descanso.
“Nós entrevistamos vários especialistas de segurança pública, advogados e historiadores, tanto no Brasil quanto nos EUA. A preocupação do Bernard era de não tirar conclusões precipitadas e de tentar entender de onde vem esse problema, que não é só de alguns policiais corruptos, mas sim a responsabilidade da sociedade toda”, conta a produtora executiva.
Também jornalista, Fabíola Aquino afirma ter saído com “muita admiração e respeito” pela profissão. “É moda hoje falar de “fake news” ou de achar que o auge da profissão foi no passado quando se conduzia grandes inquéritos com muito mais recursos e tempo. Mas Bruno Wendel e o Jornal Correio demonstraram que o jornalismo investigativo ainda existe e pode ser determinante para elucidar casos e obrigar a sociedade a se transformar positivamente”, diz.
Serviço
13º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo
28, 29 e 30 de junho de 2018
Universidade Anhembi Morumbi | Rua Casa do Ator, 275 | Vila Olímpia | São Paulo - SP - Brasil
Inscrições: através do site congresso.abraji.org.br