- 27.03
- 2008
- 14:26
- Abraji
Declaração de Atlanta é o tratado mais amplo até hoje sobre acesso a informações públicas
Leia (em inglês) a íntegra da declaração:
http://www.informacaopublica.org.br/files/Atlanta_Declaration_and_Plan_of_Action.pdf
Foi divulgada ontem (em 26 de março de 2008) a Declaração de Atlanta, o mais amplo documento produzido até hoje sobre como deve ser o acesso a informações públicas no mundo. Trata-se de uma compilação das melhores regras e conceitos de transparência considerando-se as experiências e as restrições existentes no momento em vários países.
A Declaração de Atlanta é resultado de uma conferência promovida pelo Carter Center (www.cartercenter.org), organização criada pelo ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter (prêmio Nobel da Paz de 2002). Participaram da redação do documento 125 especialistas em direito a informações públicas de 40 países. A conferência foi realizada de 27 a 29 de fevereiro de 2008, em Atlanta, no Estado da Geórgia.
Jimmy Carter participou das discussões e presidiu a plenária final na qual foi aprovado o texto preliminar da declaração. Os participantes do encontro finalizaram o documento nas semanas seguintes, por meio de um debate fechado na Internet.
O texto relaciona as providências a serem tomadas pelos governos, em todos os seus níveis, com relação a seus arquivos.
Também são explicitadas as obrigações de organismos multilaterais internacionais. A ONU (Organização das Nações Unidas), a OEA (Organização dos Estados Americanos), o Conselho da Europa e o Banco Mundial, entre outras instituições, devem dar o exemplo de transparência em suas próprias ações e cotidiano administrativo.
A Declaração de Atlanta é inovadora por incorporar vários conceitos à transparência pública. Por exemplo, o texto enfatiza o papel das empresas privadas que oferecem serviços públicos ou lidam com áreas de amplo interesse da população.
Eis a redação do item 5, da seção de princípios: “O direito de acesso a informação se aplica a atores não-estatais que: recebem fundos públicos ou benefícios (diretos ou indiretos); que desempenham funções públicas, incluindo o fornecimento de serviços públicos; que exploram recursos públicos, incluindo recursos naturais.
O direito de acesso a informação se estende apenas ao uso daqueles fundos ou benefícios, atividades ou recursos. Além disso, todos devem ter o direito de acesso a informação em poder de corporações de alta lucratividade quando essa informação for requerida para o exercício da proteção de qualquer direito humano como reconhecido na Declaração Universal de Direitos Humanos”.
Essa inclusão de empresas privadas entre os atores obrigados a fornecer informações públicas foi inspirada, em parte, no modelo existente na África do Sul, um dos países com a legislação mais abrangente nessa área de transparência pública.
A sistematização do direito de acesso faz referência, entre outros tópicos, à necessidade de governos terem uma política de arquivos consistente e perene. A idéia é evitar que a troca de políticos no poder não provoque uma queda no fluxo de acesso a informações.
Há também a recomendação específica para que todos os países de fato tenham uma lei ampla garantindo o direito a informações públicas. O Brasil não tem essa lei, embora o direito esteja na Constituição. Várias leis brasileiras tratam do assunto de maneira dispersa, muitas vezes mais para assinalar quais são as exceções do que para garantir a transparência.
O conceito internacionalmente aceito, e agora consagrado na Declaração de Atlanta, é o de que só uma lei abrangente pode de fato garantir o acesso a informações públicas. Essa medida evita que o grau de transparência pública varie apenas conforme a boa vontade dos grupos ocupando o governo de um determinado país.
A Declaração de Atlanta reconhece o direito de os governos eventualmente classificarem documentos como confidenciais ou secretos. Mas o “acesso a informação é a regra; o segredo é a exceção”, diz o texto em sua seção sobre princípios. Outro aspecto relevante é a necessidade de haver um instrumento que “obrigue a liberação total, depois de um período de tempo razoável, de qualquer documento que tenha sido classificado como secreto ou confidencial por razões excepcionais à época da sua criação”.
No caso do Brasil, as leis em vigor contêm brechas. É possível um documento ser mantido em segredo eternamente se o governo brasileiro assim o desejar. Em alguns países, 30 anos é um prazo máximo considerado padrão para a maioria dos documentos secretos serem liberados ao público.
Há na Declaração de Atlanta menções específicas à necessidade de uma “mídia livre e independente como um componente fundamental para o estabelecimento e completo uso do direito de acesso a informações”. Também fica reconhecido que esse direito é uma das fundações para “participação dos cidadãos, boa governança, eficiência na administração pública, cobrança de responsabilidade e esforços para combater a corrupção, mídia e jornalismo investigativo, desenvolvimento humano, inclusão social e realização de outros direitos socioeconômicos, políticos e civis”.
A Declaração de Atlanta é um documento indicativo. Não tem poder de obrigar um país, organismos multilaterais ou empresas a adotarem as regras sugeridas. Mas esta é a primeira vez que uma organização conceituada internacionalmente como o Carter Center se dedica a resumir todos os conceitos básicos sobre acesso a informações públicas.
Entre os 125 participantes da conferência de 27 a 29 de fevereiro estiveram dois brasileiros –Atila Roque, do Colegiado de Gestão do Inesc (Instituto de Estudos Sócioeconômicos - www.inesc.org.br), e Fernando Rodrigues, vice-presidente da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo). Tanto o Inesc como a Abraji fazem parte do Fórum de Direito de Acesso a Informações Pública(www.informacaopublica.org.br) no Brasil.
O documento de Atlanta foi divulgado inicialmente em inglês. Em breve, o Carter Center providenciará traduções para o espanhol e para o francês. Essas versões para outros idiomas, quando disponíveis, poderão ser encontradas no seguinte endereço: www.cartercenter.org/accesstoinformaiton.html.