- 14.07
- 2005
- 12:14
- MarceloSoares
Cracolândia, o encontro de diferentes realidades
ÉRIKA VIEIRA e LETÍCIA MASSA - REPÓRTER DO FUTURO
-Não entendo o que você fala, não entendo!
É isso que ouvimos em meio ao barulho de galinhas e frangos trancados em pequenas gaiolas para o abate. O cheiro insuportável quase nos mantém longe do balcão. Viva, uma galinha foi colocada na grande balança para logo ser vendida. Era quase como se estivéssemos em uma cidade exótica como Macau, Cingapura, Taiwan. A oriental que atendia no local mostrou-se assustada quando soube que éramos reportes, e deu um jeito de nos mandar embora.
Ao andar mais um pouco na travessa da Avenida Rio Branco, não muito longe do Terminal Princesa Isabel encontramos uma praça acolhedora. Com fortes traços indígenas, algumas mulheres falavam outro idioma, desta vez o espanhol dos bolivianos. A língua era outra, porém nos deparamos novamente com o medo e a desconfiança. As tentativas de aproximação para puxar conversa não tiveram muito êxito: elas foram embora arrastando seus filhos pela mão, como se estivessem à procura de um lugar seguro para se refugiarem.
Não estamos em outro país. Diferentes idiomas se encontram aqui mesmo na cidade de São Paulo, mais especificamente na região da Cracolândia. Local taxado como o reduto da pobreza, também guarda em suas ruas uma grande riqueza cultural gerada na fusão de diferentes povos, raça e valores.
Foi uma boa conversa no “Bar dos Amigos” que nos fez entender o motivo de tanta apreensão entre os habitantes daquela comunidade. “Por mim, eu acabava com todos os depósitos de ferro velho da região” disse Lúcia ao se referir aos carroceiros que transitam pelo bairro. Com o calor de final de tarde, Lúcia Araújo, 48 anos, não pensou duas vezes antes de encher novamente seu copo com cerveja gelada. Moradora do bairro há dez anos, desde então cuida do bar que, 35 anos antes, já era de seu marido.
Para a moradora, são muitos os depósitos de ferro velho na área. Com tanta matéria prima para reciclar, eles acabam se instalando na região. “O problema é que fazem muita sujeira” disse a dona do pequeno bar com a voz em alto tom. "Por mim, eles não voltam nunca mais”, disse a irmã de Lúcia, Iunice Araújo, que também bebia com sede a cerveja.
Os carroceiros não são os únicos que desagradam aos moradores; são apenas os mais honestos. Muitos infratores, traficantes e menores foram retirados dali pela polícia durante a operação Cracolândia II, no inicio do mês de maio. Mais conhecida como “operação pente fino”, a ação teve como objetivo retirar do local todos os moradores de rua que estão de alguma forma com a situação irregular perante as leis brasileiras.
Ocorrida há mais de um mês, a ação policial na famosa Cracolândia teve então ótimos resultados para os moradores locais, como aumento de segurança e de limpeza. Custando dois reais a pernoite, algumas pensões da região costumam abrigar carroceiros, e pessoas que em geral trabalham na região. Após a limpeza policial na área, algumas destas casas foram lacradas por serem utilizadas como pontos de tráfico.
Muitos foram os destinos dos moradores de rua que passaram pela Blitz policial. Entre os jovens, os que eram foragidos voltaram para FEBEM. Já os que faziam parte da lista dos desaparecidos, foram levados a uma casa de apoio junto com tantos outros que eram moradores de rua e usuários de drogas como o crack.
Vivendo no Bom Retiro e em outras regiões centrais de São Paulo, os bolivianos representam a maioria da imigração ilegal no país. Tanto a polícia local quanto os moradores sabem da existência de oficinas de roupas que utilizam o trabalho escravo como forma de lucro. Segundo a polícia local, os imigrantes ilegais só podem ser abordados se estiveram em “atitude suspeita”, ou seja, infringindo a lei de alguma forma. Porém apenas a Polícia Federal pode prendê-los.
Ainda próximo à Avenida Rio Branco, na Rua Aurora, outra comunidade estrangeira de imigrantes pode ser encontrada. Altos, magros e negros, muitos nigerianos, para disfarçar a nacionalidade, se vestem com roupas de jogadores de basquete dos EUA. A Policia Federal, diferentemente do caso dos bolivianos, já prendeu mais de 70 estrangeiros nos arredores da padaria Marília, ponto de encontro de muitos deles. Entre os presos tinham “mulas”, pessoas que viajam traficando drogas no estômago. Mas também havia trabalhadores honestos.
Conhecida como pólo da diversidade, a cidade de São Paulo além de apresentar diversidades sociais, também apresenta inúmeras diversidades culturais. Quem chega aqui sem direção, corre o risco de se deparar com as mais surpreendentes e realidades sem precisar se locomover muito. É como nos disse o camelô: você quer ônibus para onde?
- “Minha filha, daqui sai ônibus até para o Ceará!”.
-Não entendo o que você fala, não entendo!
É isso que ouvimos em meio ao barulho de galinhas e frangos trancados em pequenas gaiolas para o abate. O cheiro insuportável quase nos mantém longe do balcão. Viva, uma galinha foi colocada na grande balança para logo ser vendida. Era quase como se estivéssemos em uma cidade exótica como Macau, Cingapura, Taiwan. A oriental que atendia no local mostrou-se assustada quando soube que éramos reportes, e deu um jeito de nos mandar embora.
Ao andar mais um pouco na travessa da Avenida Rio Branco, não muito longe do Terminal Princesa Isabel encontramos uma praça acolhedora. Com fortes traços indígenas, algumas mulheres falavam outro idioma, desta vez o espanhol dos bolivianos. A língua era outra, porém nos deparamos novamente com o medo e a desconfiança. As tentativas de aproximação para puxar conversa não tiveram muito êxito: elas foram embora arrastando seus filhos pela mão, como se estivessem à procura de um lugar seguro para se refugiarem.
Não estamos em outro país. Diferentes idiomas se encontram aqui mesmo na cidade de São Paulo, mais especificamente na região da Cracolândia. Local taxado como o reduto da pobreza, também guarda em suas ruas uma grande riqueza cultural gerada na fusão de diferentes povos, raça e valores.
Foi uma boa conversa no “Bar dos Amigos” que nos fez entender o motivo de tanta apreensão entre os habitantes daquela comunidade. “Por mim, eu acabava com todos os depósitos de ferro velho da região” disse Lúcia ao se referir aos carroceiros que transitam pelo bairro. Com o calor de final de tarde, Lúcia Araújo, 48 anos, não pensou duas vezes antes de encher novamente seu copo com cerveja gelada. Moradora do bairro há dez anos, desde então cuida do bar que, 35 anos antes, já era de seu marido.
Para a moradora, são muitos os depósitos de ferro velho na área. Com tanta matéria prima para reciclar, eles acabam se instalando na região. “O problema é que fazem muita sujeira” disse a dona do pequeno bar com a voz em alto tom. "Por mim, eles não voltam nunca mais”, disse a irmã de Lúcia, Iunice Araújo, que também bebia com sede a cerveja.
Os carroceiros não são os únicos que desagradam aos moradores; são apenas os mais honestos. Muitos infratores, traficantes e menores foram retirados dali pela polícia durante a operação Cracolândia II, no inicio do mês de maio. Mais conhecida como “operação pente fino”, a ação teve como objetivo retirar do local todos os moradores de rua que estão de alguma forma com a situação irregular perante as leis brasileiras.
Ocorrida há mais de um mês, a ação policial na famosa Cracolândia teve então ótimos resultados para os moradores locais, como aumento de segurança e de limpeza. Custando dois reais a pernoite, algumas pensões da região costumam abrigar carroceiros, e pessoas que em geral trabalham na região. Após a limpeza policial na área, algumas destas casas foram lacradas por serem utilizadas como pontos de tráfico.
Muitos foram os destinos dos moradores de rua que passaram pela Blitz policial. Entre os jovens, os que eram foragidos voltaram para FEBEM. Já os que faziam parte da lista dos desaparecidos, foram levados a uma casa de apoio junto com tantos outros que eram moradores de rua e usuários de drogas como o crack.
Vivendo no Bom Retiro e em outras regiões centrais de São Paulo, os bolivianos representam a maioria da imigração ilegal no país. Tanto a polícia local quanto os moradores sabem da existência de oficinas de roupas que utilizam o trabalho escravo como forma de lucro. Segundo a polícia local, os imigrantes ilegais só podem ser abordados se estiveram em “atitude suspeita”, ou seja, infringindo a lei de alguma forma. Porém apenas a Polícia Federal pode prendê-los.
Ainda próximo à Avenida Rio Branco, na Rua Aurora, outra comunidade estrangeira de imigrantes pode ser encontrada. Altos, magros e negros, muitos nigerianos, para disfarçar a nacionalidade, se vestem com roupas de jogadores de basquete dos EUA. A Policia Federal, diferentemente do caso dos bolivianos, já prendeu mais de 70 estrangeiros nos arredores da padaria Marília, ponto de encontro de muitos deles. Entre os presos tinham “mulas”, pessoas que viajam traficando drogas no estômago. Mas também havia trabalhadores honestos.
Conhecida como pólo da diversidade, a cidade de São Paulo além de apresentar diversidades sociais, também apresenta inúmeras diversidades culturais. Quem chega aqui sem direção, corre o risco de se deparar com as mais surpreendentes e realidades sem precisar se locomover muito. É como nos disse o camelô: você quer ônibus para onde?
- “Minha filha, daqui sai ônibus até para o Ceará!”.