Conselho Nacional de Direitos Humanos envia ao Congresso recomendações sobre PL das fake news
  • 17.07
  • 2020
  • 18:35
  • Abraji

Liberdade de expressão

Conselho Nacional de Direitos Humanos envia ao Congresso recomendações sobre PL das fake news

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) aprovou por unanimidade, no dia 10.jul.2020, uma Recomendação sobre medidas legislativas de combate à desinformação, incluindo o PL 2630/2020, conhecido como PL das fake news. O CNDH levou em consideração dados públicos de acesso à internet e usou como referência manifestações da sociedade civil sobre o tema.

A Recomendação nº 09, enviada ao Congresso Nacional, fez 11 apontamentos sobre as tentativas de debelar os conteúdos falsos no ambiente digital. O documento pede que quaisquer iniciativas legislativas que tenham por objeto o tema “notícias falsas” observem “o respeito aos padrões internacionais de direitos humanos, à liberdade de expressão e informação e à promoção da diversidade na internet.”

O texto foi deliberado após reunião da Comissão Permanente de Direito à Comunicação e à Liberdade de Expressão, composta por várias organizações da sociedade civil, como a Abraji. “O conselho é plural. O próprio governo faz parte, outras instituições autônomas também, como é o meu caso enquanto defensor público”, explica Renan Sotto Mayor de Oliveira, presidente do CNDH.

Todos os integrantes do conselho entenderam que não é o momento de o Brasil traçar regras para um tema tão complexo. Assim como a Abraji ressaltou ao longo das últimas semanas, o documento sugere o fim de medidas que possam acarretar identificação ou rastreabilidade em massa de usuários. E destaca que o PL vulnerabiliza jornalistas, defensores de direitos humanos e ativistas, ao violar outras regulações, como o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Dados Pessoais sobre os direitos à privacidade, à liberdade de expressão e ao acesso à informação.

“Quando o CNDH alerta o Congresso Nacional para a necessidade de um maior debate sobre esse tema, está evitando uma possível judicialização posterior”, esclarece Oliveira. Na análise do presidente do CNDH, baseada nas leis internacionais de direitos humanos, se o PL for aprovado do jeito que está, pode acabar nas mãos Supremo Tribunal Federal (STF), justamente por possíveis inconstitucionalidades.

Cristina Castro, coordenadora da Comissão Permanente de Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão do CNDH, argumenta que um tema tão importante como “regulação das fake news e do ambiente digital” não deveria ser discutido de maneira apressada e em plena crise sanitária, quando há restrições à participação social. O PL 2630/2020 passou pelo Senado sem sessões de discussão abertas à sociedade civil ou ao público, uma vez que as comissões da Casa não estavam funcionando.

Castro lembra que o CNDH é composto por instituições representativas de minorias, como organizações do movimento negro, que são alvos frequentes de campanhas de difamação nas redes. “Mesmo assim, votaram favoráveis à recomendação por entender que, em que pese o transtorno da desinformação, a censura tolhendo a liberdade de expressão é um remédio muito mais amargo do que a doença das fake news.”

Outro ponto do documento indica que qualquer projeto de lei que tenha como objeto a desinformação deve passar por audiências públicas, diálogos com a sociedade civil e seminários com jornalistas e usuários especializados no tema. A Câmara dos Deputados iniciou uma série de debates, transmitidos no portal edemocracia, com a presença de diversas esferas de discussão para opinar sobre a pauta.

Acesso restrito

Outra preocupação do CNDH é a possibilidade de a lei restringir o acesso à internet. Apoiada nos dados da pesquisa TIC Domicílios do IBGE de 2019, a Recomendação nº9 pondera que 85% das pessoas da classe D e E têm acesso à internet somente por meio de celular e, muitas vezes, a partir de pacotes de dados que permitem acesso apenas às redes sociais, o chamado zero rating.

A conselheira Cristina Castro avalia que o “discurso de ódio não é naturalizado entre as pessoas, e sim impulsionado. O que deve ser considerado é esse impulsionamento como prática. Com frequência, esses cidadãos reproduzem o conteúdo enganoso ingenuamente e não podem ser punidos por isso”.

O documento demanda uma prestação de contas sobre as medidas de moderação tomadas pelas plataformas digitais. “As redes sociais já podem retirar conteúdos do ar sem decisão judicial”, aponta Cristina. Um aspecto preocupante levantado por especialistas durante as discussões do PL é a confusão sobre a definição de fake news. Na segunda-feira, 13 de jul.2020, o site humorístico Sensacionalista recebeu um aviso de possibilidade de suspensão de sua conta no Facebook por divulgar "conteúdos falsos".

Denúncias de agressões virtuais

Além das questões relativas ao PL 2360/2020, a Comissão Permanente de Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão do CNDH decidiu fazer um novo levamento. Está recebendo denúncias de jornalistas, ativistas, comunicadores, defensores de direitos humanos e cidadãos que sofreram agressão, ameaça, exposição, extorsão, censura, remoção indevida de conteúdo ou outra violação de direitos nas plataformas digitais, cometidas por terceiros ou pelas próprias plataformas. As respostas devem ser deixadas neste formulário.

“Embora denúncias insistentes por parte da sociedade civil estejam sendo conduzidas em nível nacional e internacional, a inobservância de direitos fundamentais relacionados à imprensa aumenta continuamente. Os ataques contra jornalistas durante a pandemia reforçam a hostilidade do governo federal em relação ao acesso à informação e à transparência’”, relata Juliana Fonteles, que representa a Abraji na comissão do CNHD.

:: Veja o texto da Recomendação nº 9 na íntegra::

Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil

Assinatura Abraji