Congresso da Jeduca debate violência nas escolas e os dilemas da cobertura de educação
  • 22.09
  • 2023
  • 17:30
  • Laura Toyama

Formação

Congresso da Jeduca debate violência nas escolas e os dilemas da cobertura de educação

Violência e ataques nas escolas, o Novo Ensino Médio e as dificuldades da cobertura sobre educação. Com essas pautas, a Jeduca (Associação de Jornalistas de Educação) reuniu professores, especialistas, estudantes e jornalistas no 7º Congresso Internacional de Jornalismo de Educação, realizado em São Paulo, nos dias 18 e 19.set.2023. Foram 13 mesas de debates, todas em torno de um questionamento: "Que sociedade queremos?".

A mesa de abertura contou com uma conversa entre a presidente da Jeduca, Renata Cafardo, o diretor da Abraji Tiago Rogero, autor do podcast Projeto Querino (Rádio Novelo), e Nicole Hannah-Jones, autora de The 1619 Project (The New York Times Magazine) sobre educação antirracista. 

Rogero e Hannah-Jones defenderam o ativismo como forma de combater o racismo desde suas estruturas, dentro e fora das redações. Para eles, o jornalismo verdadeiramente antirracista é aquele que age para diversificar suas fontes e seus profissionais. “Todo jornalismo é ativismo. A cobertura da educação é uma forma de agir e cobrar as instituições por mais diversidade”, afirmou Hannah-Jones. Rogero complementou dizendo que “o racismo é uma escolha reiterada” e que deve haver um esforço ativo para mudar esse cenário, sobretudo em um país de não-brancos onde as redações espelham outra realidade, com sua maioria branca.

Todas as mesas foram transmitidas em tempo real, através do canal de Youtube da Jeduca e estão disponíveis para os participantes do evento. O congresso também contou com a cobertura de estudantes que fazem parte da redação-laboratório do projeto Repórter do Futuro, da Oboré Projetos Especiais, que, em parceria com a Jeduca, produziu conteúdos sobre as mesas.

Violência nas escolas e o papel da imprensa

Três mesas do 7º Congresso da Jeduca abordaram a violência nas escolas, a partir de diferentes visões. Em março de 2023, após um atentado a uma escola em São Paulo, a Jeduca publicou uma cartilha de recomendações e pontos de atenção para a cobertura desse tipo de ocorrência. O material tem como objetivo orientar jornalistas sobre como entregar as informações que são de interesse público, sem incentivar novos episódios de violência, através do chamado efeito contágio.

No congresso, a pesquisadora Telma Vinha (Unicamp) e a pesquisadora de dados norte-americana Sherry Towers debateram os perigos deste fenômeno na mesa “A cobertura dos ataques às escolas e o efeito contágio”. Para as especialistas, uma mídia interessada somente nos lucros de audiência de uma cobertura dessa natureza pode corroborar para a disseminação da violência em ambiente escolar. Reportagens que levam o nome do agressor, suas motivações, armas usadas, entre outros detalhes, podem servir de roteiro para novos ataques, que são compartilhados e glorificados em grupos que se organizam nas plataformas digitais.

Towers também compartilhou sua análise sobre a estrutura de uma subcultura extremista crescente na internet. A articulação de comunidades mórbidas, que se popularizam cada vez mais entre adolescentes, geralmente do sexo masculino e brancos, não estão mais na chamada deepweb, cujo acesso era mais difícil. Desde 2010, observa-se uma migração desse conteúdo para o que ela chama de “superfície da internet” – servidores do Discord e redes sociais como Facebook e X, o antigo Twitter.

Em outra mesa, profissionais da imprensa brasileira falaram sobre suas coberturas de episódios recentes e os cuidados que foram tomados. Em complemento ao debate sobre o papel da imprensa, o evento trouxe educadores para comentar suas vivências em situações de violência no ambiente escolar, para além de ataques. A violência armada e situações de opressão vividas por professores no dia a dia também devem ser um ponto de atenção para o jornalismo.

Os educadores compartilharam sua visão sobre as soluções que podem ser implementadas preventivamente para evitar ataques nas escolas. A prevenção ao bullying, atenção psicossocial e o treinamento dos profissionais para o que chamam de “pedagogia da presença”, quando os professores se abrem ao diálogo, foram os caminhos mais citados.

Futuro da educação e os alunos no centro do debate

Além de abordarem questões ligadas à ética da cobertura de educação, os debates também refletiram sobre a audiência e o espaço para pautas do gênero na mídia tradicional. Também foi discutido o futuro da educação no Brasil com a inserção de novas tecnologias, como a inteligência artificial, e o que pensam os estudantes sobre a reformulação do Ensino Médio.

Na mesa “Novo Ensino Médio: o que pensam os jovens”, três estudantes de diferentes regiões do país falaram de suas experiências e impressões sobre a nova estrutura curricular implantada nas escolas desde o ano passado. Os três mostraram posição bastante crítica às mudanças.

Organizado em cinco áreas, chamadas de Itinerários Formativos – Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Sociais e Formação Técnica e Profissional – o Novo Ensino Médio aumentou a carga horária de aulas para além da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e os estudantes devem optar, sem possibilidade de troca, qual área pretendem seguir. Em regiões mais remotas, em que as escolas têm configurações mais simples, as escolhas de itinerários são limitadas por questões estruturais e condenam os estudantes a escolher áreas com as quais não se identificam. Foi o que relatou a estudante Maria Luiza Vasconcelos, de Feira Nova (PE).

Segundo os estudantes, o foco está, atualmente, mais nos itinerários que nas matérias base, que seguem sendo o conteúdo de provas de vestibulares, concursos e do Enem, principal prova nacional de ingresso no ensino superior. 

A estudante Maria Eduarda Escobar, de Porto Alegre (RS), questionou o ministro da Educação, Camilo Santana, sobre qual a solução para o descompasso entre o conteúdo ensinado e o que é cobrado nas provas do Enem. A resposta do ministro desagradou os estudantes. Segundo ele, a possibilidade de mudança do conteúdo das provas só estaria prevista para 2025. E o ministro ainda aconselhou que, se a mudança fosse o desejo da estudante, ela deveria “esperar para prestar o vestibular daqui a dois anos”.

Os estudantes também sugeriram que os jornalistas se atentem mais ao que os jovens têm a dizer a respeito dessas e de outras questões que envolvem a educação no país. “Se o foco é juvenil, vocês devem ouvir o que pensam os estudantes”, disse Maria Eduarda. 

Assinatura Abraji