• 13.03
  • 2013
  • 12:32
  • Nathalia Carvalho

Com três anos de apuração, repórter do Zero Hora revela como encontrou personagem

Publicado em 11 de março de 2013 no Comunique-se

Embora a série ganhadora do Esso Nacional de 2012 seja chamada de ‘Filho da Rua’, não foi bem nas ruas de Porto Alegre que a jornalista Letícia Duarte encontrou o personagem principal da sua matéria. Durante o seminário regional realizado pela Abraji no último sábado, 9, ela revelou que, a princípio, a busca começou pelas vias e que, ao perceber que os jovens mentiam, ela buscou outras alternativas. “Tentei falar com os meninos e percebi que eles inventavam que a família tinha morrido ou a casa tinha pegado fogo. Eles não queriam ser encontrados”, disse.

Diante da situação, foi no Conselho Tutelar que Letícia conheceu a história de Felipe (nome fictício), o garoto de 11 anos que desde os cinco mora na rua. Usuário de crack, a vida dele foi acompanhada desde 2009 e as informações foram reunidas em 16 páginas publicadas pelo jornal no ano passado. Desde o início, a reportagem tinha como objetivo mostrar como nasce um menino de rua e o motivo de ele não voltar para a casa. Com o projeto aprovado, Letícia levou o trabalho de apuração paralelamente. “Na redação as coisas não são ideais e tem que fazer outras pautas também”. 

Encontrar Felipe sempre foi um desafio. Com a ajuda da mãe do garoto, todas as entrevistas realizadas por Letícia eram resultado de longa busca. “Ele mora na rua, some e muda de lugar quando alguém o encontro. Era muito difícil saber onde ele estava”. No início, a repórter tentava encontrar com ele ao menos uma vez por mês, mas em alguns casos o reencontro durou até seis meses. Sempre tive a sensação de que não ia encontrar mais o personagem, que ele iria sumir para sempre e não me conceder mais entrevistas”. 

Não fazia parte do projeto a apuração de três anos, mas a história ganhou contornos que exigiam mais cuidados e espaço, de acordo com a jornalista do Zero Hora. A organização do conteúdo foi a grande aliada de Letícia. “Quando chegava da apuração, transcrevia tudo que tinha no bloco e nos áudios. Às vezes, eu fazia parte do texto para preservar o que tinha acontecido e não perder os detalhes. Todos os documentos foram digitalizados e o material organizado por datas”, explica. Todos os áudios, textos e fotos eram separados e a repórter sempre usou pequenos resumos para facilitar a busca de conteúdo. “Se não for assim, você se perde”.

Letícia não é a primeira a afirmar que o jornalista não sai ileso de uma reportagem como essa. Após a publicação do material, Felipe foi internado pela oitava vez. Dez dias depois, fugiu. “Ele tem o meu celular, mas nunca tinha me ligado. Quando fugiu da clínica, ele telefonou para se desculpar e pedir para que eu não ficasse brava. Ele sabe que eu me importo com ele, acabei virando uma referência”. A repórter comenta que lidar com questões que ela não pode mudar foi a parte mais difícil. “Essa pauta me desafia e eu ainda estou tentando aprender”. Ela segue acompanhando a história de Felipe, mas ainda não sabe se isso vai resultar em algum trabalho posterior.

Assinatura Abraji