Cobertura de epidemias é tema de painel no Congresso
  • 23.06
  • 2017
  • 13:29
  • Mariana Gonçalves

Formação

Cobertura de epidemias é tema de painel no Congresso

As repórteres Ana Lucia Azevedo, do jornal O Globo, e Fabiana Cambricoli, do Estadão, vêm a esta edição do Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo contar os bastidores de suas coberturas sobre recentes epidemias no Brasil. 

Em novembro de 2016, um ano após o anúncio pelo Ministério da Saúde de um surto de microcefalia associado ao vírus zika, Fabiana escreveu a reportagem especial “Uma emergência esquecida”, em que acompanhou, pelo Estadão, o primeiro ano de vida de quatro crianças afetadas pela doença. Quatro meses depois, Ana Lucia publicou em O Globo história sobre “A febre que silencia as florestas”, mostrando como o alastramento da febre amarela pelo país neste ano provocou o que especialistas consideraram “a maior matança de animais na história recente da Mata Atlântica”.

Por três semanas de apuração, Ana Lucia foi à região do Vale do Rio Doce, entre Minas Gerais e o Espírito Santo, perceber, com os próprios ouvidos, a ausência dos macacos entre as árvores das florestas. “Havia uma linha de silêncio”, diz. “Normalmente, é difícil encontrar bichos na mata, ainda mais morrendo; desta vez, havia um monte de mortos à vista. A matança era inevitável.” 

A repórter, que publicou o texto em fevereiro, foi às cidades de Caratinga e Santa Teresa logo no início do ano. “Doença não se cobre na redação ou pela internet”, diz. Além das visitas à mata, Ana Lucia, que há tempos cobre ciência, estudou previamente a febre amarela. “A área de saúde é muito técnica, e tem que ser vista como qualquer cobertura especializada. Você tem que chegar preparado, contra-argumentar, conquistar a confiança dos cientistas”. 

Fabiana, por sua vez, começou a preparar em janeiro do ano passado a reportagem que só seria lançada dez meses depois. Segundo ela, a pauta foi sugerida porque, embora “todos os holofotes estivessem sobre o zika” em 2015, “inevitavelmente, o assunto seria esquecido” dali a um tempo. Queria acompanhar o dia-a-dia das crianças diagnosticadas com a doença (“e não chegar só um ano depois”); por isso, marcou viagens, contatou os pais todas as semanas, ia junto com a família ao médico.

Como o zika ainda era desconhecido, a repórter acabou descobrindo alguns dos efeitos da doença durante a própria cobertura. Mesmo assim, Fabiana “não ficava restrita aos materiais, geralmente releases, que o governo enviava aos jornalistas”. Consultou documentos acadêmicos e entrevistou diversos especialistas. Ao fim da apuração, avaliou as diferenças entre a evolução da microcefalia em crianças de diferentes realidades socioeconômicas, em casos de São Paulo e do Nordeste.  

“Os números gerais são dados [pelos governos] sem contextualização”, afirma Fabiana. A falta de transparência de órgãos oficiais de saúde, problema apontado por ambas as repórteres, não só dificulta a cobertura do assunto como é um obstáculo à própria superação das epidemias pela sociedade. Na medida em que cumpre uma função social, o repórter deve saber onde está a notícia, buscar escrever matérias analíticas e, nesse processo, não se tornar refém das informações que lhe passam. “Um monte de gente quer que você não saiba o que está havendo”, diz Ana Lucia. 

No caso da febre amarela, ela conta, a inoperância no Ministério da Saúde e do Estado de Minas Gerais levaram a um “abismo sanitário” na região, em que houve cobertura vacinal insignificante. “E o problema da febre é que nós só vemos a ponta do iceberg; ela é uma doença que passa completamente despercebida”. 

“As notícias sobre doenças afetam a vida de todo mundo”, continua a jornalista, “e a mídia tem um papel essencial na hora de dar as informações corretas e passar esses temas complexos de forma completa e clara”. Fabiana destaca o pânico que pode ser gerado a partir de informações equivocadas sobre o tema. 

“Como pode acontecer uma epidemia de febre amarela, uma doença prevenível há tantos anos?”, questiona Ana Lucia. “E que causa, ainda por cima, um desastre ambiental desses?”

O painel “Histórias de epidemias: as vidas afetadas pela zika e febre amarela” acontece na sexta-feira, 30 de junho, das 9h às 10h30. 

O 12º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo acontece nos dias 29 de junho a 1º de julho na Universidade Anhembi Morumbi, unidade Vila Olímpia, em São Paulo. Com mais de 60 painéis e oficinas, o evento dura das 9h às 17h30 nos três dias. As inscrições estão abertas até 26 de junho e podem ser feitas em congresso.abraji.org.br.

Serviço

12º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo

Universidade Anhembi Morumbi

Rua Casa do Ator, 275, Vila Olímpia – São Paulo, SP

29 de junho a 1º de julho de 2017

Inscrições até 26 de junho em congresso.abraji.org.br

Assinatura Abraji