• 16.03
  • 2016
  • 09:11
  • Amanda Ariela

Agência Pública lança iniciativas ao completar 5 anos de trabalho

Em comemoração ao seu aniversário de 5 anos, a Agência Pública acaba de lançar duas inciativas para apoiar o jornalismo independente e inovador no Brasil e na América Latina. 

A primeira é o Mapa do Jornalismo Independente, que lista informações sobre 70 iniciativas de mídia independente de todo o Brasil. O mapa é dividido em duas abas: a primeira traz a seleção da Agência Pública e a segunda permite que o leitor selecione as iniciativas de que mais gostar.

O mapa é interativo e mostra veículos que surgiram apenas na internet, fruto de projetos coletivos e não ligados a grandes grupos de mídia, políticos, organizações ou empresas. É possível enviar e adicionar outras iniciativas através do preenchimento de um formulário no site, já que o mapa tem caráter colaborativo.

Um dos objetivos deste projeto é permitir a compreensão do funcionamento e da sustentabilidade dessas inciativas, através de uma construção coletiva. 

A segunda iniciativa que a Agência Pública irá lançar em comemoração aos seus 5 anos é a Casa Pública, um centro para produção, incentivo, discussão e apoio ao jornalismo independente e inovador no Brasil e na América Latina.

A Casa Pública ficará no bairro carioca do Botafogo e funcionará das quartas aos sábados, das 10h às 21h. Será inaugurada em 19 de março, com um evento que deve reunir nomes do jornalismo em duas mesas. A primeira acontecerá às 14 horas e será uma entrevista de Tai Nalon, do Aos Fatos e de Cristina Tardáguila, da Agência Lupa, com Laura Zommer, do Chequeado sobre verificação de informações. Na segunda, Marina Amaral, da Agência Pública, irá entrevistar Chico Otávio, de O Globo e Rubens Valente, da Folha de S.Paulo sobre jornalismo investigativo.

Com a Casa Pública, a Agência pretende “fortalecer a produção de conteúdos de qualidade, aprofundados, pautados pelo interesse público e pela defesa da democracia, em um momento de explosão de novas iniciativas, coletivos, sites e organizações que se propõem a produzir jornalismo fora da tradicional indústria de notícia.”

A ideia é incubar novas inciativas de jornalismo independente e promover a troca de experiências entre profissionais do mundo todo interessados em jornalismo investigativo e direitos humanos.

A Casa Pública também irá receber exposições, mostras de filmes, apoiar e receber eventos de jornalismo e criar workshops e laboratórios, como em uma espécie de centro cultural do jornalismo.

Natália Viana, uma das diretoras da Pública, conversou com a Abraji sobre as novas iniciativas e o futuro da agência de notícias:

Quanto tempo levou o levantamento e a pesquisa para os perfis que estão no mapa do jornalismo independente?

 Levou aproximadamente 3 meses, desde uma primeira listagem que fizemos com base no que tínhamos de cabeça, até as fases seguintes, de conversas telefônicas, busca online, ligações e envios de questionários para iniciativas que acreditávamos se enquadrarem no perfil. 

Quanta gente foi envolvida nessa pesquisa?

Foram 3 pessoas. 

Que avaliação/resumo do contexto do jornalismo independente no Brasil é possível fazer através da observação das iniciativas que estão no mapa do jornalismo independente?

A primeira é que há cerca de um ano há uma explosão de novas iniciativas de jornalismo independentes. Já havia algumas iniciativas fundadas antes, mas a maioria surgiu nos últimos 12 meses. Vejo uma preocupação grande em produzir jornalismo diferente, instigante, e crescentemente um compromisso em cobrir o que não é bem coberto pela imprensa tradicional; daí o surgimento de muitos sites voltados para nichos de assuntos ou regionais. Há uma grande diversidade de formatos e visual dos sites, assim como do público alvo, e a grande maioria é tocada por jovens jornalistas. Há ainda pouca clareza sobre como essas iniciativas conseguirão a sustentabilidade ao longo prazo, mas há muita disposição e abertura para tentar caminhos diferentes. Finalmente, eu vejo um compromisso e um entusiasmo grande com o simples  fazer jornalístico, o que já por si demonstra um ambiente de frescor em uma área que tem sofrido muito com a crise do modelo tradicional e o pessimismo que a acompanha.  

Todas as iniciativas são sem fins lucrativos, certo? 

Não. Na verdade a grande maioria tem a pretensão de ser comercial – embora poucas consigam fechar as contas no final do mês.

Como funcionará o incubamento de novas iniciativas na Casa Pública?

Estamos estudando algumas possibilidades e conhecendo grupos que precisam de orientação para uma fase inicial. Ainda não temos definido quem será o primeiro grupo a ser incubado, mas vamos usar um modelo semelhante ao que fizemos com a Ponte, que durante 6 meses ocupou um espaço dentro da redação da Pública em São Paulo e recebeu apoio para lançar um site e organizar sua operação inicial, bem como os primeiros passos para a constituição legal da organização. O que aprendemos com a incubação da Ponte é que cada processo é um processo, e portanto não há uma fórmula única. O que importa é construirmos junto com os jornalistas o caminho a ser percorrido e usar a musculatura da Pública para tentar buscar soluções que ajudem a profissionalizar e fortalecer esse campo novo no jornalismo brasileiro.  

As novas iniciativas que irão para a “incubadora” da Casa Pública poderão partir dos endereços levantados no mapa do jornalismo independente?

Ainda estamos estudando algumas possibilidades – ou seja, nada impede. Mas no começo vamos dar prioridade a grupos do Rio de Janeiro.

Além do mapa e da Casa Pública, quais serão os próximos passos da Agência Pública?

Este ano vai ser ainda mais animado que os anteriores, né? Teremos eleição, então estamos pensando em como o Truco vai atuar nesse período, estamos fechando agora a primeira edição das Microbolsas, que teve como tema o Sistema Judiciário – recebemos mais de 80 propostas e agora estamos selecionando os vencedores – e tanto a Casa Pública quando o Guia estão ainda no começo. Além de eventos, vamos trabalhar em duas frentes na Casa Pública: LABS, que são laboratórios de experimentação em storytelling e transmídia – ou seja, vão nascer investigações super interessantes e inovadoras daí, algumas publicadas este ano ainda – e também teremos um espaço para visitas/residência de jornalistas estrangeiros. O mapa, também, vai ter novos desdobramentos, que vão ser publicados em alguns meses.   

Qual foi o melhor momento desses 5 anos?

A Pública tem duas diretoras, eu e a Marina Amaral. A Marina deve ter a escolha dela, mas eu raramente esqueço a alegria que foi a fundação da Pública, mesmo. Foi um ano maravilhoso de muito trabalho e muita expectativa, e logo na inauguração tivemos a presença de grandes jornalistas como o Andrew Jennings, que é um grande parceiro e amigo até agora, e o Kristnn Hrafnsson do WikiLeaks, além do apoio de organizações de jornalismo independente e investigativo de toda a América Latina e os EUA que até hoje são nossos parceiros de caminhada. Acho que naquele momento todo mundo acreditou que podíamos fazer algo que teria impacto no jornalismo brasileiro.

E o pior?

Pra mim, foi ser assediada, assaltada e ameaçada veladamente pelo serviço secreto em Angola, quando estava no ano passado fazendo uma reportagem no país junto com a documentarista Eliza Capai. Após filmarmos uma entrevista com familiares de 15 rappers e ativistas que estão presos há 9 meses porque participavam de um grupo de estudos de um livro sobre táticas de protesto não-violentas, fomos seguidas, nosso equipamento foi roubado por membros dos serviços secretos, e a polícia passou a vigiar a casa em que estávamos hospedadas. Chegaram a dizer aos vizinhos que estávamos no país “para organizar manifestações”, o que é ilegal e poderia ser usado para nos prender por espionagem. Foi uma tensão muito grande, mas rendeu uma série de reportagens da qual eu me orgulho bastante.  

Uma das reportagens feitas pela Agência Pública em Angola pode ser lida neste link

Qual a sensação de saber que muitas iniciativas independentes surgiram depois da Pública, inspiradas por ela?

É uma felicidade tremenda pensar nisso. Acho que o fato de que a Pública sempre buscou aprimorar o seu jornalismo, seja na apuração, fact-checking, edição, pauta, visualização de dados, mas também na inovação, ajudou muita gente ver que é possível inventar coisas novas e também que é possível sim fazer bom jornalismo fora do esquema tradicional de produção. Mas parte dessa influência também vem de escolhas consciente que fizemos. Os concursos de microbolsas, por exemplo, são uma contribuição nossa para fomentar a vontade dos jornalistas brasileiros de perseguirem suas próprias reportagens de maneira independente; e assim plantamos uma semente. O mesmo fazemos com organizações que nos procuram buscando ajuda para iniciarem seus projetos – ajudamos sempre que temos tempo, porque acreditamos neste futuro em que o jornalismo será mais colorido, mais diverso e menos concentrado – e com a nossa ajuda na incubação da Ponte. Há um tempo temos feito gestões para aumentar o campo de doadores para o jornalismo sem fins lucrativos, participamos sempre dos congressos da Abraji, e agora temos a Casa Pública, que vai ser o local para podermos fortalecer ainda mais essa nossa contribuição.


Assinatura Abraji