Abraji subscreve carta aberta contra projeto de Lei Constitucional do Ciberespaço proposta na Venezuela
  • 23.01
  • 2019
  • 11:18
  • Redação

Liberdade de expressão

Abraji subscreve carta aberta contra projeto de Lei Constitucional do Ciberespaço proposta na Venezuela

Como integrante da rede IFEX-ALC, a Abraji subscreveu a carta aberta das organizações sem fins lucrativos Access Now e Derechos Digitales contra o projeto de Lei Constitucional do Ciberespaço da República Bolivariana da Venezuela. A proposta, segundo a imprensa local, pode ser aprovada ainda em janeiro e contém dispositivos que ameaçam a liberdade de expressão naquele país. A íntegra da carta, publicada originalmente em espanhol e inglês:

Frente ao anteprojeto de Lei Constitucional do Ciberespaço de la República Bolivariana de Venezuela

As organizações, cidadãos e cidadãs abaixo subscritas expressamos nossa preocupação frente ao Anteprojeto de Lei Constitucional do Ciberespaço da República Bolivariana da Venezuela, documento que foi obtido pela imprensa. Segundo a informação recebida, o projeto poderá ser aprovado neste mês de janeiro de 2019 pela Assembleia Nacional Constituinte (ANC).

Desde 2007, o Estado venezuelano desenvolveu políticas públicas voltadas a controlar a liberdade de expressão e o acesso à informação na internet. Destacam-se a lei de responsabilidade social no rádio, televisão e meios eletrônicos (2010), o Decreto de Estado de Exceção e Emergência Econômica e a Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância promulgada pela ANC (2017), que violam os direitos on-line. A internet na Venezuela é cada vez menos livre. Com frequência, sites e serviços on-line são bloqueados. Na segunda metade de 2018, foram bloqueados importantes sites de notícias e o acesso à rede Tor, e desde 12 de janeiro de 2019 a Wikipedia está bloqueada pelo provedor de internet do Estado (CANTV). Na Venezuela, usuários têm sido detidos e processados por ações como tuitar informação disponível publicamente em páginas da web e tem havido quebra de sigilo de comunicações privadas.

A Lei Constitucional do Ciberespaço justifica e expande ainda mais os poderes do governo para controlar e vigiar o uso da internet sem contrapesos institucionais, o que representa uma grave ameaça aos direitos humanos dos venezuelanos e venezuelanas. O anteprojeto cria um sistema nacional de ciberdefesa, sob a doutrina de “defesa integral da nação” com autoridade sobre um vagamente definido “ciberespaço da República Bolivariana da Venezuela”, fazendo com que os venezuelanos fiquem restritos a uma rede controlada, isolada e fragmentada.

Em síntese, esse projeto tem um enfoque de securitização do uso de tecnologias de informação e comunicação, baseado em noções de soberania segurança nacional e “controle da ordem interna” (Artigos 3, 5, 7 e 8) que são utilizados para justificar a adoção de medidas que violam direitos fundamentais, incluindo a liberdade de expressão, o direito a participar de assuntos públicos e a proteção de dados pessoais. Além disso, estende o conceito de terrorismo a qualquer atividade realizada na internet ou através dela, que possa “causar terror” ou “desestabilização econômica, política ou social” (Art. 4), o que permitiria punir a expressão de opiniões legítimas.

Consideramos que as mais graves violações aos direitos humanos e aos padrões internacionais estão nos seguintes pontos:

  • Desconhece que o Estado venezuelano é o garantidor dos direitos fundamentais de todos os venezuelanos e venezuelanas. Coloca erroneamente o usuário como responsável pela segurança no ciberespaço (Art. 13) e impõe a ele o dever de denunciar situações irregulares que coloquem em risco ou afetem o uso e acesso legal ao ciberespaço, a paz interna, a ordem política, econômica, social e/ou o bem comum em geral (Art. 24).
  • Contradiz a doutrina e legislação de proteção de dados pessoais, já que pede aos usuários que respeitem a integridade dos dados pessoais (Art. 20), ao invés de colocar nas mãos do Estado a garantia pela proteção. A lei autoriza o Estado a tratar dados sensíveis sem o consentimento do usuário (Art. 22), ordena que a autoridade tenha acesso quando solicitar informação armazenada por entes públicos e privados por razões de “defesa e segurança”, “ordem interna” e “proteção dos direitos e interesses cidadãos” (Arts. 18, 19 e 23), e permite à autoridade supervisionar, encaminhar e registrar dados e informações transmitidas através de qualquer serviço de internet ou telecomunicações (Art. 25).
  • Obriga aos provedores de serviçoes de difusão de mensagens (o que pode incluir desde redes sociais a serviços de mensagem instantânea) a censurar conteúdos sem ordem judicial prévio nem respeito a garantias mínimas de liberdade de expressãi, nem ao devido processo legal. Atribui aos provedores o dever oneroso de “prevenir, denunciar, neutralizar ou eliminar a difusão de dados e informação que atente contra a honra, vida privada, intimidade, imagem, reputação de pessoas, publicidade enganosa e ilícitos, promoção do ódio, intolerância, discriminação, assédio, exploração sexual, pornografia infantil, ou desestabilização econômica, política e social da nação (Art. 26)
  • Cria o perigoso conceito de “segurança do conteúdo” para legitimar ferramentas, políticas, normas e “ações preventivas” para “combater o ódio” na internet (Arts. 10 e 11). Isto se alinha aos dispositivos da “Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância” aprovada pela ANC em 2017 e que está sendo usada para perseguir opositores políticos.
  • Cria uma autoridade de controle com poderes excessivos e dependente do Poder Executivo, dado que os diretores serão direta e livremente nomeados e removidos pelo presidente da República (Art. 37). Entre as competências desmedidas atribuídas à autoridade estão: determinar o que é “acesso e uso correto do ciberespaço”, realizar tarefas de vigilância ilimitadas, aplicar sanções excessivas, adotar medidas preventivas frente ao que considerarem cibercrime, ciberataque, ciberterrorismo ou qualquer mensagem que considerem prejudicial ou possa ser considerada uma ameaça (Art. 35)
  • Define de maneira ampla e arbitrária o que é infraestrutura crítica do ciberespaço e autoriza o controle discricionário sobre ela por parte do ente de ciberdefesa (Capítulo III).
  • Estabelece que os titulares de dados, provedores de serviços e usuários devem, mediante solicitação, dar acesso à autoridade a todo “recurso tecnológico” que tenham e a obrigação de cedê-lo (Art. 24).

Por todo o exposto, nos opomos à aprovação deste projeto. A legitimidade da Assembleia Nacional Constituinte foi colocada em dúvida por instituições venezuelanas e internacionais. As leis que regulam o uso de tecnologias de informação e comunicação deveriam ser promulgadas por instituições amplamente reconhecidas para manter a confiança no ecossistema da internet e mediante procedimentos democráticos e participativos, cumprindo estritamente com os padrões de direitos humanos.

O anteprojeto representa uma grave ameaça aos direitos fundamentais de todos os venezuelanos e venezuelanas, pelo que solicitamos a instâncias internacionais de proteção que estejam alertas a respeito dele e que manifestem sua posição a respeito das violações a direitos humanos que propõe.

Assinam:
Acceso Libre
Access Now
Alfa-Redi
Asociación Nacional de la Prensa de Bolivia (ANP)
Brazilian Association of Investigative Journalism (ABRAJI)
CAinfo
CENCOS Mexico
Centro de Estudios en Gobernanza de Internet – Facultad de Derecho Universidad San Martín de Porres (CGIUSMP)
Centro de Investigaciones de la Comunicación – UCAB
Centro Latinoamericano de Investigaciones Sobre Internet
Comité para la Protección de los Periodistas (Committee to Protect Journalists – CPJ)
Comité por una Radiotelevisión de Servicio Público
Creative Commons, Capitulo Venezuela
Derechos Digitales
Digital Rights Foundation – Pakistan
Dirección de Telecomunicaciones y Servicios. Universidad de Los Andes.
Electronic Frontier Foundation
Epikeia OUDH
Espacio Público
FOPEA
Fundación Acceso
Fundacion Datos Protegidos
Fundación Huaira
Fundacion Internet Bolivia.org
Fundamedios
Hiperderecho
Human Rights Foundation
Humano Derecho
Index on Censorship
Institute for War and Peace Reporting
Instituto Prensa y Libertad de Expresión
Internet Sans Frontières
Internet Society, Capítulo Honduras
Internet Society, Capítulo Panamá
Internet Society, Capítulo Uruguay
Internet Society, Capítulo Venezuela
IPANDETEC
IPLEX Costa Rica
Ipys Perú
Ipys Venezuela
Labo Ciudadano
Le Biklab
League of African bloggers and cyberactivists for democracy – AFRICTIVISTES
ObserLatInf
OBSERVACOM
Observatorio de Derechos Humanos de la Universidad de Los Andes
Open Net Korea
OpenMedia
Paradigm Initiative
PEN Venezuela
Point of View – India
Programa Venezolano de Educación-Acción en Derechos Humanos (PROVEA)
Public Knowledge
Red de Desarrollo Sostenible Honduras
Redes Ayuda
Sindicato de Periodistas del Paraguay
SMEX – Libano
SocialTic
Ubunteam
VE sin Filtro
Venezuela Inteligente
 
Alejandra Stolk – DTES-ULA
Andrés Cañizález – Profesor universitario y periodista.
Antonio Pasquali
Betty Fausta
Erick Iriarte
Iván Méndez – Periodista
Jesús Urbina – Dirección general de Comunicación de la Universidad del Zulia.
Kemel Zaidan Maluf – Analista de sistemas
Luis Carlos Díaz Vázquez – Periodista
Luis Núñez – Universidad de Los Andes
Marcelino Bisbal
Milagros Socorro – Periodista
Moraima Guanipa, periodista y docente universitaria.
Nomsa Mlambo
Raisa Urribarri – Universidad de los Andes
Soudeh Rad – Spectrum
William Peña – Periodista independiente especializado en Telecom

Assinatura Abraji