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Dicas da Abraji sobre a GIJC, conferência global de jornalismo investigativo

Dicas da Abraji sobre a GIJC, conferência global de jornalismo investigativo

Neste ano, Cristina Zahar e Reinaldo Chaves — secretária executiva e coordenador de projetos da Abraji — participaram pela primeira vez da  conferência mundial GIJC (Global Investigative Journalism Conference), que aconteceu de 26 a 29 de setembro, em Hamburgo (Alemanha).

Mais de 1.700 jornalistas de 130 países estiveram lá para falar de suas realidades e desafios, como a luta contra a desinformação, os ataques contra o jornalismo e a democracia, as novas possibilidades do jornalismo de dados para investigação e a colaboração entre países para investigar grandes casos. Quem organizou a conferência foi a GIJN (Global Investigative Journalism Network), em parceria com a Netzwerk Recherche, a associação alemã de jornalistas investigativos.

Estiveram lá 14 brasileiros, entre jornalistas e pesquisadores que estudam na Europa, como participantes ou palestrantes para falar da rotina diária de cobertura de um país tão complexo como o Brasil.

Abaixo, os destaques feitos pelos representantes da Abraji sobre a GIJC:

Jornalismo sob autocratas

Tradicionalmente a GIJC começa com um painel sobre os desafios do jornalismo no mundo (The Challenges Ahead), no caso ataques contra os direitos humanos, a democracia e à imprensa independente. Drew Sullivan, editor e co-fundador da OCCRP (Organized Crime and Corruption Reporting Project), por exemplo, apontou a colaboração entre jornalistas e diferentes veículos de mídia como o caminho para vencer esses obstáculos. O uso de tecnologia por autocratas para repressão e desinformação tornou-se um desafio diário para o trabalho jornalístico, já que isso em alguns países significa também controlar a internet, com censura e bloqueio de transmissão.

Em outro painel (Searching the Deep Web) o jornalista pesquisador Albrecht Ude apresentou ferramentas para encontrar conteúdos de interesse público na deep web, com privacidade – normalmente os mecanismos de pesquisa convencionais cobrem apenas uma parte muito pequena da Internet. Há diversos serviços gratuitos que podem acessar a deep web, como o Startpage, o Common Vulnerabilities and Exposures e arquivos muito importantes como Wayback Machine archive.today, para você mesmo arquivar páginas de informações. Várias outras dicas estão em sua apresentação aqui e aqui.

Cristina Zahar mediou a mesa “Quando os autocratas atacam: a mídia independente sob fogo cerrado”. Mahfuz Anam, publisher do maior jornal de língua inglesa de Bangladesh, o Daily Star, falou de como o governo moveu 84 processos contra ele em 2016, além de ter cortado a verba de publicidade oficial e feito campanha junto a empresas para que não anunciassem no Star. Já o russo Ivan Golunov, do site Meduza, contou como foi preso pela polícia de Moscou de forma arbitrária, acusado de tráfico de drogas, após publicar reportagem sobre corrupção no serviço funerário. Nesta apresentação, ele conta o desfecho feliz da história e como foi possível chegar a ele. A chinesa Ying Chan, fundadora e professora do Centro de Estudos de Jornalismo e Mídia de Hong Kong, revelou como é possível driblar a censura na China, usando livros e redes sociais para fazer jornalismo.

Conteúdos sobre programação traduzidos

Reinaldo participou de bootcamps durante a conferência, que abordaram diferentes linguagens de programação. No Github da Abraji está disponível a tradução, feita por ele, das aulas sobre Python, ministradas por Nils Mulvad e Tommy Kaas, da Kaas & Mulvad, empresa dinamarquesa pioneira e especializada em investigações com dados para diversos públicos. Eles ensinaram como usar o Python para web scraping, seja em APIs (application programming interface) ou em páginas de internet HTML, e sua posterior organização e análise. Em breve, também será traduzido o material sobre linguagem R.

Jornalismo de muitos dados

A ganhadora do prêmio Pulitzer e Knight Chair in Data Journalism, Sarah Cohen, apresentou técnicas para lidar com os dados não-estruturados, como o uso de algoritmos, inteligência artificial, machine learning e mineração de texto. Ela destacou o uso do DocumentCloud e do Overview para analisar PDFs e extrair nomes e buscas avançadas, o Voyant para análises avançadas de texto em sites,  o Dedupe.io usado para combinar listas de endereços ou empresas, e o projeto Aleph para acessar e pesquisar com segurança grandes quantidades de dados - independentemente de ser um banco de dados do governo ou um arquivo de e-mail vazado.

Sarah falou também sobre as últimas tendências no jornalismo de dados (Latest Trends in Data Journalism), junto com Brant Houston, Knight Chair em Investigative and Enterprise Reporting na University of Illinois at Urbana-Champaign e um dos fundadores da GIJN, e Jennifer LaFleur, Data editor no Investigative Reporting Workshop e durante muito tempo responsável por investigações de dados na ProPublica e Reveal, além de ser ex-diretora de treinamentos na Investigative Reporters and Editors (IRE).

Brasil, ambiente hostil

Jornalistas brasileiros apresentaram suas experiências e dicas de cobertura em temas como corrupção (Guilherme Amado), meio ambiente (Fabiano Maisonnave), agronegócio e supply chain (André Campos), direitos humanos (Andrea Dip) e mineração (Maurício Ângelo).

André Campos, em “Digging into Food & Agriculture”, mostrou como fez a investigação que revelou de que forma o Brasil exportou 1 milhão de galinhas contaminadas para o Reino Unido, e Fabiano Maisonnave falou da complexa situação política atual e de como isso mudou radicalmente a visão governamental sobre o meio ambiente na Amazônia e em outros biomas nacionais. 

No painel “Humans Rights at Home”, Andrea Dip falou um pouco sobre o contexto político brasileiro, com governantes perseguindo e expondo jornalistas, militantes e defensores de direitos humanos, e disse estar acompanhando a tendência, em outros países do mundo, de um levante da extrema-direita populista que se une ao fundamentalismo religioso contra os movimentos sociais, o feminismo, as pautas LGBTQ. Trouxe como exemplo sua reportagem de 2015 “Os pastores do Congresso” e a série de reportagens Transnacionales de La Fé que fez junto a outros 15 veículos da América Latina, sob a coordenação da Columbia University's Columbia Journalism Investigations.

Investigando assassinatos

Zahar mediou também a mesa “Como investigar a morte de seu colega”. Nela, o francês Laurent Richard, do Forbidden Stories, explicou em sua apresentação como o jornalismo colaborativo trabalha na investigação de casos de assassinato de jornalistas em várias partes do mundo. Já a tcheca Pavla Holcová, fundadora do site investigace.cz, contou o que fez logo depois que seu colega Jan Kuciak, foi assassinado. Ela deu dicas de segurança e do que não perguntar a quem passou por uma situação assim. A ucraniana Anna Babinets, editora-chefe do site Slidstvo.info, apresentou como desenvolveu o documentário sobre a morte de um famoso jornalista bielo-russo que vivia e trabalhava em Kiev, realizado em parceria com a OCCRP.

Durante a conferência, aconteceu a eleição de membros da diretoria da GIJN. A América Latina está representada no conselho por Fernando Rodrigues, ex-presidente da Abraji e fundador do Poder360.

Para pesquisar mais sobre esses e outros temas da conferência deste ano, a GIJN preparou um site com dicas e boa parte das apresentações. 

Assinatura Abraji